Tomás explica: A intenção do autor nesta obra (Suma contra os gentios)

Ingobertus (cerca de 880), Rei Salomão em seu trono

1. Entre os estudos humanos, o da sabedoria é o mais perfeito, o mais sublime, o mais útil e o mais alegre.

O mais perfeito, porque enquanto o homem entrega-se ao estudo da sabedoria já vai participando, de algum modo, da verdadeira beatitude. Por isso, diz o sábio: Feliz o homem que permanece na sabedoria (Eclo 14,22).

O mais sublime, porque por ele o homem aproxima-se o mais possível da semelhança de Deus, o qual fez todas as coisas sabiamente (Sl 103,24). E porque a semelhança é causa do amor, o estudo da sabedoria nos une de modo precípuo a Deus, pela amizade. Por esta razão se diz no livro da Sabedoria: A sabedoria é um tesouro infinito para os homens, que, ao usarem dele, fazem-se participantes da amizade de Deus (Sb 7,14).

O mais útil, porque pela própria sabedoria chega-se ao reino da imortalidade, conforme se lê no mesmo livro: O desejo da sabedoria conduz ao reino eterno (Sb 6,21).

O mais alegre, finalmente, porque está também escrito neste livro: a sua companhia não é amarga, nem enfadonha é sua convivência, mas alegre e cheia de gáudio (Sb 8,16).

2. Confiando na piedade divina para prosseguir neste ofício de sábio, embora isto exceda nossas forças, temos por firme propósito manifestar, na medida do possível, a verdade que a fé católica professa, eliminando os erros contrários a ela. Por isso, sirvo-me aqui das palavras de Hilário: Estou consciente de que o principal ofício da minha vida é referente a Leia mais deste post

Tomás explica: Qual é o ofício do sábio

Personificação da Sabedoria na biblioteca de Éfeso, atual Turquia

Com este artigo inauguro uma nova página no blog, chamada “Tomás explica”, com capítulos da Suma contra os gentios. Manterei a ordem original dos livros e capítulos na página, porém variando os assuntos abordados. Enjoy!

Minha boca publicará a verdade e meus lábios odeiam a impiedade (Pr 8,7)

1. A terminologia vulgar, que o Filósofo diz ser conveniente respeitar ao se dar nome às coisas (II Tópicos 1, 109ª), preferiu em geral julgar como sábios aqueles que diretamente ordenam as coisas e as governam com habilidade. Por isso, entre outras funções que os homens atribuem ao sábio, a de que pertence ao sábio ordenar é proposta pelo Filósofo (I Metafísica 2, 982ª; Cmt 2, 42-43). Ora, a regra do governo e da ordenação de todas as coisas que se dirigem para um fim deve ser assumida deste fim. Assim, cada coisa fica otimamente disposta enquanto se ordena convenientemente para o seu fim, visto ser o fim o bem de cada uma. Por esse motivo, vê-se também que, nas artes, tem o governo e como que o principado sobre as outras aquela à qual pertence o fim. Por exemplo: a arte médica governa e ordena a arte farmacêutica por que a saúde, que é objeto da medicina, é o fim de todos os medicamentos preparados na farmácia. Coisa semelhante acontece na arte da navegação com relação à arte da construção naval, bem como na arte militar com relação à arte equestre e a toda indústria bélica. Essas artes que têm o principado sobre as outras são denominadas arquitetônicas ou artes principais. Daí os seus artífices – que são chamados arquitetos – reclamarem para si o nome de sábios.

2. Como, porém, os supramencionados artistas que tratam dos fins de coisas singulares não atingem o fim universal de todas as coisas, são, por isso, chamados de sábios desta ou daquela coisa. E é neste sentido que São Paulo escreve: Como sábio arquiteto coloquei o fundamento (1 Cor 3,10).

O nome de sábio, porém, é simplesmente reservado só para quem se dedica à consideração do fim do universo, que é também o princípio. De onde afirmar o Filósofo que pertence ao sábio considerar as altíssimas causas (I Metafísica 1, 981ª – 2, 982ª; Cmt 1 e 2, 24-28 e 49).

3. O fim último de cada coisa é intencionado pelo seu primeiro autor ou motor. O primeiro autor e motor do universo é o intelecto, como mais além se verá. Convém, pois, que o fim último do universo seja o bem do intelecto, que é a verdade. Donde ser a verdade o fim último de todo o Leia mais deste post

Tomás: inteligência e oração

Sasseta (Stefano di Giovanni, 1392-1450), Santo Tomás de Aquino em Oração (1430-1432), Budapest

Adaptam-se bem a São Tomás de Aquino as palavras do Evangelho que acabámos de ouvir proclamar:  “Quem portanto transgredir um só destes preceitos, mesmo mínimos [da Lei e dos Profetas], e ensinar aos homens a fazer o mesmo, será considerado mínimo no reino dos céus. Mas quem, ao contrário, os observar e os ensinar aos homens, será considerado grande no reino dos céus”.

Tomás começou de longe. O seu caminho foi longo. Sentia-se um apaixonado “filósofo cristão”:  “Por amor a ti estudei!”.

Perseguia uma consciência que, mesmo servindo-se de princípios racionais e métodos filosóficos, se abandonava às inspirações que emanam dos “dogmas”, trabalhava em contacto com eles, considerava-os hipóteses fecundas, servia-se das analogias que sugeriam e, mais do que outras coisas, sabendo que eram verdadeiras, imergia a sua mente de pensador no mistério do qual emergiam. Sabia valorizar as duas formas complementares de sabedoria: a filosófica,que se funda na capacidade que o intelecto possui, dentro dos limites que lhe são conaturais, de averiguar a realidade; e a teológica, que se funda sobre a Revelação e examina os conteúdos da fé, alcançando o mistério de Deus.

Protegia a sua inteligência, feita para a “santa verdade”. Alimentava o recolhimento interior porque, dizia, quando a inteligência trabalha intensamente, a vontade e as suas capacidades afectivas tendem para enfraquecer. Tomás fazia sua a exortação do Livro da Sabedoria: “Por isso pedi, e foi-me dada a inteligência; supliquei, e veio a mim o espírito de sabedoria” (Sb 7, 7). Rezava incessantemente, ou prostrado ou Leia mais deste post

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