[OFF] Julián Marías: Sociedade e Estado
28 fevereiro, 2012 2 Comentários
Julián Marías em sua biblioteca
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Com esse artigo inauguro também uma nova página no blog, intitulada [OFF], cujo objetivo é levar aos leitores do Suma Teológica bons textos com temas não relacionados, necessariamente, a Santo Tomás de Aquino ou à Suma Teológica (bem como ao grande Chesterton, que tem cadeira cativa nesse blog e merece lugar de destaque). Seguindo a linha de apresentar textos de alguns dos “profetas” de nosso passado relativamente recente, após vários escritos e vídeos do (literalmente) grande Chesterton, vai agora um texto de 1945 de Julián Marías, da escola de Ortega, intitulado “Sociedade e Estado”. Nele, Julián Marías relata a progressiva intervenção do Estado na vida privada e, mais uma vez, qualquer semelhança com nossa situação atual é mera genialidade do autor. Boa leitura!
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A alteração nas relações entre a sociedade e o Estado está em estreita conexão com o destino das unidades históricas em nosso tempo. Não cabe aqui uma análise da estrutura atual daquelas duas realidades; limitar-nos-emos pois, a assinalar, quase telegraficamente, o que há de peculiar e de novo em sua interação.
O termo intervencionismo poderia designar com uma só palavra o caráter que, de modo crescente, o Estado assume desde o século XIX, e com ritmo acelerado desde 1918. Convém, no entanto, proceder com cuidado, para não impedir por falta de rigor, que essa palavra esclareça a nossa situação. A intervenção progressiva do Estado na vida social não é privativa de nossa época, mas, como acabo de dizer, caracteriza um grande período; a simples aceleração desse processo nos últimos trinta anos não tem um significado em si mesmo, se não for particularizada em dois sentidos: primeiro, quanto à sua qualidade; segundo, quanto às suas causas.
O intervencionismo estatal foi imposto pelo próprio crescimento do Estado; isto é, assumindo o desempenho de novas tarefas, o Estado teve de exercer sua ação sobre as zonas da vida social que se achavam em conexão com aquelas tarefas. Assim, por exemplo, quando o Estado se torna responsável da sanidade do país e se encarrega da organização e manutenção de hospitais, clínicas e serviços de assistência, é normal que exija a vacinação obrigatória; se o Estado se obriga a estabelecer os centros de ensino da nação, é perfeitamente natural que exerça uma regulamentação da vida docente; desde que a ele se pede solução para os conflitos da vida econômica, necessita regular de alguma maneira a produção, o comércio, as relações de trabalho; visto que é trabalho seu proporcionar os meios de transporte, ele intervém na organização do trânsito. Tudo isto é evidente. (Outra questão na qual aqui não entrarei, é saber se é necessário ou simplesmente proveitoso que o Estado assuma todas estas funções e as intervenções correlativas, pelo menos na forma em que o fez; o caso da Inglaterra, mais uma vez, é uma advertência para uma consideração mais demorada do caso) Ora, à raiz da primeira Guerra Mundial, a multiplicação dos problemas compulsórios, somados à debilitação da sociedade em todos os países, exigiu a intervenção enérgica do Estado na maior parte dos assuntos públicos. Tudo isso seria pois normal e a situação presente diferiria da anterior somente por uma intensificação, perfeitamente justificada, de um caráter já existente; mas a questão muda de aspecto se a olhamos mais detidamente.
Seria normal que, uma vez superadas as perturbações dos primeiros anos de pós-guerra, o intervencionismo fosse cedendo, mas acontece justamente o contrário. Em segundo lugar, a intervenção estatal se foi estendendo a esferas antes não alcançadas: a religião, a raça, a condição social ou de classe, a vida intelectual, o matrimônio, a família, o número de filhos, às vezes até os costumes e as modas – a saudação, o vestuário, o adorno feminino. Pouco importa o signo dessas intervenções: o fato global de todas elas pode ser designado com o nome, tão gasto, de totalitarismo, que a rigor mais do que uma forma de Estado significa Leia mais deste post
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