Tomás responde: Existe um preceito de dar esmolas?

Bartolomé_Esteban_Perez_Murillo_St._Thomas_of_Villanueva_Distributing_AlmsBartolomé Esteban Murillo (1617-1682), São Tomás de Villanueva distribuindo esmolas

Parece que não existe um preceito de dar esmolas:

1. Com efeito, os conselhos são diferentes dos preceitos. Ora, dar esmolas é um preceito, segundo o livro de Daniel (4, 24): “Ó rei, aceita meu conselho: redime teus pecados com esmolas”. Logo, dar esmolas não é um preceito.

2. Além disso, a cada qual é lícito usar ou conservar os seus bens. Ora, conservando-os, não se pratica a esmola. Logo, é lícito não dar esmola e, portanto, ela não é um preceito.

3. Ademais, tudo o que cai sob um preceito, por um certo tempo obriga sob pena de pecado mortal, porque os preceitos afirmativos obrigam por um tempo determinado. Portanto, se dar esmola fosse um preceito, poder-se-ia determinar um tempo durante o qual pecaria mortalmente quem não a desse. Ora, não parece que seja o caso, pois sempre se pode pensar que provavelmente um indigente poderá ser socorrido de outra maneira, e que o dinheiro da esmola poderia ser-nos necessário, no presente ou no futuro. Logo, parece que dar esmola não é um preceito.

4. Ademais, todos os preceitos se reduzem aos do Decálogo; entre eles nada concerne à esmola. Logo, dar esmola não é um dos preceitos.

EM SENTIDO CONTRÁRIO, ninguém é condenado ao castigo eterno por omissão de uma obra que não é preceito. Ora, alguns deverão sofrer esta pena, porque não praticaram a esmola, como se vê no Evangelho de Mateus (25, 41). Portanto, dar esmola é um preceito.

Tomas_RespondoComo o amor ao próximo é um preceito, é necessário que tudo o que é indispensável para guarda-lo caia também sob o preceito. Ora, em virtude desse amor, não somente devemos querer o bem ao nosso próximo, mas inclusive realiza-lo: “Não amemos com palavras nem com a língua, mas com ações e em verdade”, diz a primeira Carta de João (3, 18). Para querer e operar o bem em relação ao próximo é preciso socorrê-lo nas necessidades, a saber, dando-lhe esmolas. Logo, dar esmola é um preceito.

Mas, como os preceitos tratam de atos de virtude, dar esmola será obrigatório na medida em que este ato for necessário para a virtude, isto é, enquanto a reta razão o exige. Ora, isso implica duas ordens de considerações, relativamente ao que dá e ao que recebe a esmola. Do lado do doador, deve-se levar em conta que Leia mais deste post

Tomás responde: O cisma é um pecado especial?

Iluminura do séc. XIV onde Dante vê, horrorizado, os semeadores de escândalo e cismáticos percorrendo a vala onde, a cada volta, são cortados ao meio por um diabo

Parece que o cisma não é um pecado especial:

1. Com efeito, diz o papa Pelágio, o cismo “soa a ruptura”. Ora, todo pecado causa uma ruptura. Está escrito em Isaías (59,2): “Vossos pecados vos dividiram de vosso Deus”. Logo, o cisma não é um pecado especial.

2. Além disso, são considerados cismáticos aqueles que não obedecem à Igreja. Ora, em todos os seus pecados o homem desobedece aos preceitos da Igreja, pois, segundo Ambrósio, o pecado é “uma desobediência aos mandamentos celestes”. Logo, todo pecado é um cisma.

3. Ademais, a heresia nos separa da unidade da fé. Portanto, se o cisma implica uma divisão, parece não se diferenciar do pecado de infidelidade como um pecado especial.

EM SENTIDO CONTRÁRIO, Agostinho distingue entre cisma e heresia, quando diz: “O cismático tem as mesmas crenças e os mesmos ritos que os outros; só se compraz na separação da congregação. O herege, porém, tem opiniões que o afastam do que a Igreja Católica crê”. Portanto, o cisma é um pecado especial.

Segundo Isidoro, chamou-se com o nome de cisma “a cisão dos ânimos”. Ora, a cisão opõe-se à unidade. Por isso se diz que o pecado de cisma se opõe diretamente e por si à unidade. Com efeito, assim como na natureza, o que é acidental não constitui a espécie, assim também na moral. O que é intencional é essencial, enquanto o que está fora da intenção existe como acidental. Por isso o pecado de cisma é propriamente um pecado especial, pelo fato de alguém tender a se separar da unidade realizada pela caridade. A caridade une não somente uma pessoa a outra pelo laço do amor espiritual, mas ainda toda a Igreja na unidade do Espírito. Chamam-se, portanto, cismáticos propriamente ditos aqueles que por si mesmos e intencionalmente se separam da unidade da Igreja, que é a unidade principal. A união articular entre os indivíduos é, pois, ordenada à unidade da Igreja, da mesma forma que a organização dos diversos membros no corpo natural é ordenada à unidade do corpo inteiro.

Ora, pode-se considerar a unidade da igreja de duas maneiras: na conexão ou na comunhão recíproca dos membros da Igreja entre si; e, além disso, na ordenação de todos os membros da Igreja a uma única cabeça. Segundo a Carta aos Colossenses (2, 18-19): “Inchado pelo sentido de sua carne e não se mantendo unido à cabeça, da qual todo o corpo, por suas articulações e ligamentos, recebe alimento e coesão para realizar seu crescimento em Deus”. Ora, esta Cabeça é o próprio Cristo, do qual o soberano pontífice faz Leia mais deste post

Fragmentos: Fé, Esperança e Caridade

O amor não poderia ser reto se não tivesse estabelecido de início o justo fim da esperança, e isso não é possível se falta o conhecimento da verdade. Deves ter de início a fé para conhecer a verdade, em seguida a esperança para colocar teu desejo no verdadeiro fim, enfim a caridade pela qual teu amor será totalmente retificado.

Compendium I 1

A fé mostra o fim, a esperança faz tender para ele, a caridade realiza a união com ele.

Super I Tim. 1,5, n. 13

 

A fé é certo aperitivo (praelibatio quaedam) desse conhecimento que será nossa felicidade na vida eterna. Por isso o Apóstolo (Hb 11, 1) diz que ela é “a substância das realidades que esperamos”, como se ela fizesse subsistir em nós de uma maneira começada as realidades que esperamos, isto é, a bem-aventurança futura. O Senhor ensinou que esse conhecimento beatificante consiste em duas coisas: a divindade da Trindade e a humanidade de Cristo, quando ele se dirigia ao Pai dizendo (Jo 17, 3): “A vida eterna é que eles te conheçam, tu, o único verdadeiro Deus, e aquele que enviaste, Jesus Cristo”. É a respeito dessas duas realidades, a divindade da Trindade e a humanidade de Cristo, que se refere todo conhecimento da fé. Isso nada tem de admirável, porque a humanidade de Cristo é o Leia mais deste post

Fragmentos: Seguir a Cristo

Não é uma grande coisa finalmente renunciar a tudo [muitos filósofos não têm nenhum cuidado com as riquezas, sublinha Tomás em outras passagens]. A perfeição consiste antes em seguir Cristo, e isso se faz pela caridade: “Se dou todos os meus bens aos pobres… senão tenho a caridade, tudo isso não me serve de nada” (1 Cor 13, 3). A perfeição não consiste em si em coisas exteriores: pobreza, virgindade, etc.; elas não são senão meios para a caridade. Por isso o Evangelista acrescenta: “E eles o seguiram”.

In Matthaeum 4,22,lect.2, n. 373

A perfeição consiste no seguimento de Cristo, enquanto o abandono das riquezas é apenas o caminho. Não basta pois, diz São Jerônimo, renunciar a seus bens; é preciso ainda acrescentar o que fez São Pedro: E nós te seguimos. [Encontramos aqui o exemplo de Abraão, que possuía grandes bens, mas a quem o Senhor pede simplesmente:] “Caminha diante de mim e sede perfeito”, mostrando assim que sua perfeição consistia precisamente em caminhar na presença do Senhor e em amá-lo perfeitamente até a renúncia de si mesmo e de todos os seus bens; o que ele mostrou de maneira eminente pelo sacrifício de seu filho.

De perfectione spiritualis vitae 8, Léon. T. 41, p. B 73

Quatro coisas que se correspondem devem ser consideradas: duas dependem de nós, em nosso agir em relação a Cristo, e duas dependem de Cristo, que as realiza em nós.

A primeira, que depende de nós, é a obediência a Cristo. … A segunda, que depende de Cristo, é a escolha que ele faz de nós e o amor que tem por nós. … A terceira, que novamente depende de nós, é a imitação de Cristo. … A quarta depende ainda de Cristo, e é a recompensa que lhe corresponde: “Eu lhes dou a vida eterna”. Como se ele dissesse, eles me seguem na terra no caminho da humildade e da inocência; farei com que eles me sigam ainda no céu e que eles entrem na alegria da vida eterna.

In Ioannem, 10,27-28, lect. 5, n. 1444-1449

Santo Tomás de Aquino, Suma Teológica, Teologia, Igreja

A consciência segundo Tomás de Aquino – Parte 2

Juan de Peñalosa, Santo Tomás de Aquino (aprox. 1610), Museo de Bellas Artes, Córdoba

Clique aqui para ler a parte 1

Só se compreendem essas fórmulas absolutas que identificam a voz da consciência com a voz de Deus à luz de seu contexto. Elas supõem a conformidade voluntariamente procurada da razão com a lei natural e ademais com Deus, mas, além dessa dependência fundadora, elas supõem ainda um ajuste virtuoso em relação aos outros homens. Tomás faz explicitamente a ligação entre essas duas atitudes em seu comentário à primeira carta a Timóteo (1, 5): “O fim do preceito é a caridade que procede de um coração puro, de uma boa consciência e de uma fé sem fingimento”.

Como a caridade é o fim do preceito? … [É necessário saber que todos os mandamentos se ordenam a promover os atos das virtudes e que as virtudes se agenciam entre elas num organismo do qual a caridade é o cume]. As virtudes teologais têm o fim último por objeto. As outras têm por objeto o que permite atingir esse fim. Assim, todas as outras virtudes se referem às virtudes teologais como a seu fim. Entre as virtudes teologais, a que se aproxima mais do fim último tem razão de fim para as outras: a fé o mostra, a esperança tende para ele, a caridade une a ele. Todas se ordenam, pois, à caridade, e é assim que a caridade é o fim de todos os mandamentos. … As outras virtudes retificam a pessoa em relação ao próximo, daí vem que ele [o Apóstolo] tem uma boa consciência, porque não faz a ninguém o que não quereria que se fizesse a ele … O que é contra o próximo é, portanto, também contra a consciência. Por isso ele fala de uma “boa consciência”. Aquele que não tem boa consciência não pode amar a Deus sinceramente, porque o que não tem boa consciência teme o castigo. Ora, não há temor no amor, o temor afasta Deus em vez de unir a ele. É assim que os mandamentos, retificando a consciência, dispõem para a caridade.

Super I ad Tim. 1,5, lect. 1, n. 13-16

 

Esse texto, precioso para o seguimento de nosso propósito, dá sobre a consciência uma idéia bastante diferente da concepção enfraquecida evocada um pouco antes. Se se afirmasse que só a consciência dos santos é infalível, não se trairia o pensamento de Tomás; ele diz com efeito: “A testemunha infalível dos santos é sua Leia mais deste post

Fragmentos: A lei da caridade

Manifestamente, todos não podem passar o seu tempo em trabalhosos estudos. Cristo nos deu uma lei cuja brevidade a torna acessível a todos, e assim ninguém tem o direito de ignorá-la: esta é a lei do amor divino, esta “palavra breve” que o Senhor declara ao universo.

Esta lei, reconheçamos, deve ser a regra de todos os atos humanos. A obra de arte obedece a cânones. Igualmente o ato humano, justo e virtuoso quando segue as normas da caridade, perde sua retidão e sua perfeição se ele vem a se afastar delas. Eis, pois, o princípio de todo bem: a lei do amor. Mas ela traz consigo muitas outras vantagens.

Em primeiro lugar ela é fonte de vida espiritual. É um fato natural e manifesto que o coração amante é habitado pelo que ele ama. Quem ama Deus o possui em si. “Quem permanece na caridade permanece em Deus e Deus nele” (Jo 4, 16). E tal é a natureza do amor que ele transforma no ser amado. Se amarmos coisas vis e passageiras nos tornaremos vis e instáveis, se amarmos Deus seremos totalmente divinos: “Quem se une ao Senhor é o mesmo espírito com ele” (1Cor 6, 17). Santo Agostinho assegura: “Deus é a vida da alma, como esta o é do corpo que ela anima” … Sem a caridade ela não age mais: “Quem não ama permanece na morte” (1Jo 3, 14). Se tiverdes todos os carismas do Espírito Santo, sem a caridade estareis Leia mais deste post

Fragmentos: O crescimento espiritual da caridade

O crescimento espiritual da caridade pode ser comparado ao crescimento corporal humano. Ora, esse crescimento, embora possa distinguir-se em muitos graus, é suscetível de certas divisões bem determinadas, caracterizadas pelas atividades ou preocupações às quais o homem é conduzido durante seu crescimento. Assim, chama-se infância à idade da vida que precede o uso da razão. Em seguida, distingue-se um outro estado do homem, que corresponde ao momento em que ele começa a falar e usar a razão. Um terceiro estado é o da puberdade, quando o homem se torna capaz de gerar. E assim por diante até chegar à perfeição.

Do mesmo modo, os diversos graus da caridade distinguem-se pelos diversos esforços aos quais o homem é conduzido para o progresso da sua caridade. Primeiramente, sua principal preocupação deve ser afastar-se do pecado e resistir aos atrativos que o conduzem para o que é contrário à caridade. E isso é próprio dos incipientes, que devem alimentar e estimular a caridade para que ela se consolide. Depois, vem uma segunda preocupação, que leva o homem principalmente a progredir no bem. Tal preocupação é própria dos proficientes, que visam sobretudo fortalecer sua caridade, aumentando-a. Enfim, a terceira preocupação é que o homem se esforce principalmente por unir-se a Deus e fruir dele. E isso é próprio dos perfeitos, que “desejam morrer e estar com Cristo” (Fl 1, 23). Assim, no movimento corporal, distinguimos do mesmo modo: primeiro, o afastamento do ponto de partida; depois, a aproximação do termo; enfim, o repouso nele.

(Suma Teológica 2ª 2ae q.24 a.9)

Nós amamos Deus com todo o nosso coração, com todo o nosso espírito, com toda a nossa alma e com toda a nossa força se nada falta à caridade divina pela qual referimos tudo a Deus de maneira habitual ou atual (actu vel habitu). É essa perfeição que nos está prescrita.

Em primeiro lugar, é necessário que o homem refira tudo a Deus como a seu fim: Se comeis, e bebeis ou qualquer coisa que fazeis, fazei tudo para a glória de Deus (1Cor 10, 31). Isso se cumpre quando se consagra a sua vida ao serviço de Deus, de tal sorte que tudo o que se faz para si se encontra virtualmente ordenado para Deus, a menos que sejam atos que afastem de Deus, como o pecado.É assim que o homem ama Deus com todo o seu coração.

Em segundo lugar, é necessário que o homem submeta sua inteligência a Deus recebendo pela fé o que está divinamente inspirado: nós temos toda inteligência posta no serviço de Cristo (2Cor 10, 5). É assim que Deus é amado com todo o nosso espírito.

Em terceiro lugar, deve-se amar em Deus tudo o que se ama e referir ao amor de Deus todas as nossas afeições: se estamos fora dos sentidos, é por Deus; se somos sensatos, é por vós; é o amor de Cristo que nos impele (2 Cor 5, 13-14). É assim que Deus é amado com toda a nossa alma.

Em quarto lugar, deve-se amar a Deus de tal modo que todos nossos atos exteriores, nossas palavras e nossas ações, derivem da caridade: Que façais tudo na caridade (1Cor 16, 14). É assim que Deus á amado com toda a nossa força.

É, portanto, ao terceiro grau da caridade perfeita que todos são obrigados pela necessidade do mandamento [novo].

(De perfectione vitae spiritualis 6, Léon. T. 41, p. B 71)

Tomás de Aquino, Santo Tomás, teologia

Espírito Santo, o vínculo do amor (o Filioque)

Rubens, Anunciação (1628)

Seguindo Santo Agostinho, que realizou nesse campo uma obra inovadora e marcou com seu gênio toda a reflexão trinitária latina – distinguindo-se da tradição grega, que tomou outra via -, os teólogos da Idade Média ocidental gostavam de falar do Espírito Santo como do amor mútuo pelo qual o Pai e o Filho se amam entre si. Para Agostinho, o Espírito Santo é “a unidade das duas outras Pessoas, ou sua santidade ou seu amor”; e isso o é pessoalmente, com efeito, “que ele seja sua unidade porque é o seu amor, e seu amor porque ele é sua santidade, é claro que não é nenhuma das duas primeiras Pessoas, nas quais se operaria sua união mútua”. Não se saberia nomear melhor a não ser a partir da obra que ele realiza:

Se a caridade pela qual o Pai ama o Filho e pela qual o Filho ama o Pai nos revela a inefável comunhão de um com o outro, não seria de todo indicado atribuir como próprio o nome de Caridade ao Espírito comum do Pai e do Filho?

(De Trinitate XV 19,37)

Tomás não faz exceção a esta unanimidade e em sua primeira obra desenvolve o tema com certa complacência:

Se o Espírito Santo procede como amor, pertence-lhe ser a união do Pai e do Filho (unio Patris et Filii) em razão dessa maneira própria de proceder. Pode-se, com efeito, considerar o Pai e o Filho seja segundo eles pertençam à mesma essência, e eles são unidos assim na essência, seja segundo sejam pessoalmente distintos, e então eles são unidos pela convergência do amor (per consonantiam amoris); se se supusesse por impossível que eles não estão unidos por essência, seria necessário ainda admitir entre eles uma união de amor a fim de que sua alegria seja perfeita.

(Sent. I d. 10 q.1 a.3)

Nessa perspectiva, o Espírito é, pois, um ato de amor subsistente, que o Pai e o Filho emitem em comum, o ato pelo qual se amam reciprocamente e que os une à maneira tendencial e estática pela qual o amor une o amante ao amado. A profunda beleza dessa visão das coisas explica a sedução que ela exerceu e continua a exercer nos espíritos. Mas tem o inconveniente de Leia mais deste post

Fragmentos: A comunhão dos Santos

Como num corpo natural a operação de um membro se volta para o bem de todo o corpo, acontece o mesmo no corpo espiritual que é a Igreja. E, como todos os fiéis formam um só corpo, o bem de um é comunicado ao outro. “Nós somos todos membros uns dos outros” (Rm 12, 5). Por isso, entre os artigos de fé que os apóstolos nos transmitiram existe aquele de uma comunhão de bens (communio bonorum) na Igreja; é o que se chama a comunhão dos Santos (communio sanctorum).

 

Entre os membros da Igreja, o membro principal é Cristo, porque ele é a sua cabeça. “Deus o deu por cabeça a toda a Igreja que é seu corpo” (Ef 1, 22-23). O bem de Cristo é, pois, comunicado a todos os cristãos, como a virtude da cabeça é comunicada a todos os membros; e essa comunicação se efetua pelos sacramentos da Igreja, nos quais opera a virtude da paixão de Cristo, que dá eficazmente a graça para a remissão dos pecados.

 

Deve-se ainda saber que não é somente a eficácia da paixão de Cristo que nos foi comunicada, mas também o mérito de sua vida. E todo o bem que fizeram todos os santos é comunicado àqueles que vivem na caridade porque todos são um: “Eu sou associado a todos aqueles que te temem” (Sl 118, 63). Por isso aquele que vive na caridade participa de todo o bem que se faz no mundo inteiro.

(Expositio in Symbolum, a. 10, ns. 987, 988, 997)

 

[Duas razões podem explicar a eficácia da oração por alguma outra pessoa; evidentemente deve-se querer rezar por essa pessoa, mas o que é primeiro] é a unidade da caridade, dado que todos os que vivem na caridade formam como um só corpo. Assim, o bem de um jorra sobre todos, à maneira pela qual a mão ou qualquer outro membro está a serviço do corpo inteiro. É assim que todo bem realizado por um vale para cada um daqueles que vivem na caridade, segundo a palavra do Salmo (118, 63): “Eu sou associado a todos aqueles que te temem e que guardam os teus mandamentos”.

(Quodlibet II q.7 a.2)

 

Tomás responde: A avareza é a raiz de todos os pecados?

Gustave Doré (1832-1883), Os avarentos. Dante conversa com o papa Adriano V (Divina Comédia, Purgatório, Canto XIX)

Parece que a avareza não é a raiz de todos os pecados:

1. Com efeito, a avareza é o imoderado apetite das riquezas e opõe-se à virtude da liberalidade. Ora, a liberalidade não é a raiz de todas as virtudes. Logo, a avareza não é a raiz de todos os vícios.

2. Além disso, o desejo dos meios procede do desejo do fim. Ora, as riquezas, objeto da avareza, só são desejadas como meios úteis, como diz o livro I da Ética. Logo, a avareza não é a raiz de todo pecado, mas procede de outra raiz anterior.

3. Ademais, freqüentemente a avareza, também chamada cupidez, tem sua origem em Leia mais deste post

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