Espírito Santo, o vínculo do amor (o Filioque)

Rubens, Anunciação (1628)

Seguindo Santo Agostinho, que realizou nesse campo uma obra inovadora e marcou com seu gênio toda a reflexão trinitária latina – distinguindo-se da tradição grega, que tomou outra via -, os teólogos da Idade Média ocidental gostavam de falar do Espírito Santo como do amor mútuo pelo qual o Pai e o Filho se amam entre si. Para Agostinho, o Espírito Santo é “a unidade das duas outras Pessoas, ou sua santidade ou seu amor”; e isso o é pessoalmente, com efeito, “que ele seja sua unidade porque é o seu amor, e seu amor porque ele é sua santidade, é claro que não é nenhuma das duas primeiras Pessoas, nas quais se operaria sua união mútua”. Não se saberia nomear melhor a não ser a partir da obra que ele realiza:

Se a caridade pela qual o Pai ama o Filho e pela qual o Filho ama o Pai nos revela a inefável comunhão de um com o outro, não seria de todo indicado atribuir como próprio o nome de Caridade ao Espírito comum do Pai e do Filho?

(De Trinitate XV 19,37)

Tomás não faz exceção a esta unanimidade e em sua primeira obra desenvolve o tema com certa complacência:

Se o Espírito Santo procede como amor, pertence-lhe ser a união do Pai e do Filho (unio Patris et Filii) em razão dessa maneira própria de proceder. Pode-se, com efeito, considerar o Pai e o Filho seja segundo eles pertençam à mesma essência, e eles são unidos assim na essência, seja segundo sejam pessoalmente distintos, e então eles são unidos pela convergência do amor (per consonantiam amoris); se se supusesse por impossível que eles não estão unidos por essência, seria necessário ainda admitir entre eles uma união de amor a fim de que sua alegria seja perfeita.

(Sent. I d. 10 q.1 a.3)

Nessa perspectiva, o Espírito é, pois, um ato de amor subsistente, que o Pai e o Filho emitem em comum, o ato pelo qual se amam reciprocamente e que os une à maneira tendencial e estática pela qual o amor une o amante ao amado. A profunda beleza dessa visão das coisas explica a sedução que ela exerceu e continua a exercer nos espíritos. Mas tem o inconveniente de Leia mais deste post

Tomás responde: Era necessário que fosse anunciado à Bem-aventurada Virgem o que iria realizar-se nela?

Domenico Beccafumi, Anunciação (1545-1546)

Parece que não era necessário que fosse anunciado à Bem-aventurada Virgem o que iria realizar-se nela:

1. Com efeito, parece que a anunciação só seria necessária para obter o consentimento da virgem. Ora, tal consentimento não perece ter sido necessário, porque a concepção de uma virgem já estava anunciada de antemão pela profecia de predestinação que “se realiza sem a nossa decisão”, como diz uma Glosa. Logo, não era necessário que se realizasse tal anunciação.

2. Além disso, a bem-aventurada Virgem acreditava na encarnação, pois sem essa fé ninguém poderia estar em estado de salvação, porque, como diz a Carta aos Romanos: “A justiça de Deus é dada pela fé em Jesus Cristo” (3,22). Ora, quando alguém crê algo com certeza não precisa de ulteriores explicações. Logo, não era necessário à bem-aventurada Virgem que lhe fosse anunciada a encarnação do Filho.

3. Ademais, assim como a bem-aventurada Virgem concebeu a Cristo corporalmente, assim também toda alma santa o concebe espiritualmente; por isso diz o apóstolo na Carta aos Gálatas: “Meus filhinhos a quem de novo dou à luz, até que se forme Cristo em vós” (4, 19). Ora, aos que devem conceber Cristo espiritualmente não lhes é anunciada tal concepção. Logo não havia por que anunciar à bem-aventurada Virgem que iria conceber no seu seio o Filho de Deus.

EM SENTIDO CONTRÁRIO, o anjo, segundo o Evangelho de Lucas, lhe disse: “Eis que conceberás em teu seio e darás à luz um filho” (1, 31).

RESPONDO. Era conveniente que fosse anunciado à bem-aventurada Virgem que iria conceber Cristo:

1º. Para que fosse guardada a ordem que convinha à união do Filho de Deus com a Virgem, ou seja, que o seu espírito fosse preparado antes que ela o concebesse corporalmente. Por isso Agostinho diz: “Maria foi mais feliz de receber a fé em Cristo do que de conceber a carne de Cristo”. E acrescenta a seguir: “De nada teria servido a Maria a intimidade materna, se não tivesse sido mais feliz por levar a Cristo em seu coração do que em seu corpo”.

2º. Para que pudesse ser firme testemunha deste mistério, uma vez que fora instruída por Deus a respeito dele.

3º. Para que oferecesse a Deus os Leia mais deste post

Tomás responde: A anunciação à Bem-aventurada Virgem deveria ser feita por um anjo?

Fra Angelico (1387-1455), Anunciação, Museu São Marcos, Florença (clique para ampliar)

Parece que a anunciação à Bem-aventurada Virgem não deveria ser feita por um anjo:

1. Com efeito, segundo Dionísio, a revelação é feita aos anjos superiores por Deus. Ora, a Mãe de Deus foi exaltada acima de todos os anjos. Logo, parece que o mistério da encarnação deveria ser-lhe anunciado imediatamente por Deus e não por um anjo.

2. Além disso, se era conveniente observar nisto a ordem comum segundo a qual os mistérios de Deus são comunicados aos homens pelos anjos, convinha igualmente observar a ordem segundo a qual os mistérios divinos são propostos às mulheres pelos Leia mais deste post

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