A Lei Moral, ou “Como deixar um ateu em maus lençóis”

Michelangelo Buonarroti, 1511, teto da Capela Sistina, Roma (clique para ampliar)
Leia também:
♦ A Lei Moral 2: Lewis e a lei natural
♦ A Lei Moral 3: O Esplendor da Verdade

A princípio, acreditava que uma investigação completa de uma base racional para a fé negaria os méritos da crença e reafirmaria minha posição de ateu. No entanto, determinei que examinaria os fatos, não importassem os resultados. Assim teve início um estudo rápido e confuso sobre as principais religiões do mundo. Muito do que encontrei em edições simplificadas de religiões diferentes (achei a leitura dos verdadeiros textos sacros difícil demais) deixou-me totalmente atônito, e vi poucos motivos para me lançar a uma ou outra das diversas possibilidades. Não acreditava que houvesse base racional para uma crença espiritual subjacente a qualquer uma daquelas religiões. Isso, contudo, logo mudou. Fui visitar um pastor metodista que morava na mesma rua que eu, a fim perguntar-lhe se a fé tinha algum sentido lógico. Ele escutou com paciência minhas divagações confusas (e talvez blasfemas); em seguida, apanhou um livrinho em sua prateleira, sugerindo que eu o lesse.

O livro era Cristianismo Puro e Simples (clique para baixar), de C. S. Lewis. Nos poucos dias que se seguiram, conforme eu folheava as páginas, lutando para absorver a amplitude e a profundidade dos argumentos intelectuais apresentados pelo lendário acadêmico de Oxford, percebi que todos os meus argumentos contra a aceitação da fé eram dignos de um garoto em idade escolar. Obviamente eu tinha de começar do zero para considerar aquela que é a mais importante de todas as questões humanas. Lewis parecia conhecer todas as minhas objeções, algumas antes mesmo de eu formulá-las. Falou sobre elas em uma ou duas páginas. Quando, mais tarde, descobri que o próprio Lewis havia sido um ateu que se propusera reprovar a fé com base em argumentações lógicas, percebi como ele pôde conhecer tão bem minha trilha. Ele também a tinha percorrido.

O argumento que mais chamou minha atenção e que mais acalentou minhas idéias sobre a ciência e o espírito até seus alicerces estava logo ali, no título do Livro Um: “O certo e o errado como pista para o sentido do universo”. Embora, em muitos aspectos, a “Lei Moral” que Lewis descreveu fosse uma característica universal da existência humana, tive a impressão de que a examinava pela primeira vez.

Para compreender a Lei Moral, vale considerar, conforme Lewis o fez, que ela é evocada de centenas de maneiras, todos os dias, sem que aquele que a evoca se detenha para mostrar as bases de seu argumento. As divergências fazem parte da vida cotidiana. Algumas são relativas ao mundo material, como a esposa que critica o marido por não ter sido gentil ao conversar com uma amiga ou uma criança que declara que “não é justo” distribuir diferentes quantidades de sorvete numa festa de aniversário. Outras argumentações são encaradas com uma importância maior. Em assuntos internacionais, por exemplo, alguns argumentam que os Estados Unidos têm a obrigação moral de disseminar a democracia pelo mundo, mesmo à custa do poderio militar, enquanto outros declaram que o uso agressivo e unilateral de forças militares e econômicas é tão ruim quanto a falta de democracia em um país.

Atualmente, na Medicina, debates furiosos permeiam a questão de aceitar ou não o empreendimento da pesquisa com células-tronco embrionárias. Alguns afirmam que essa pesquisa viola a santidade da vida humana; outros supõem que o potencial para aliviar o sofrimento humano constitui uma procuração ética para prosseguir com tal trabalho.

Repare que, nesses exemplos, cada parte tenta recorrer a um padrão superior não-declarado. Esse padrão é a Lei Moral, que pode também ser chamada de “a lei do comportamento correto”, e sua existência em cada uma dessas situações parece inquestionável. O que se está debatendo é se uma ação ou outra consiste em uma aproximação às exigências de tal lei. Os acusados de ter falhado, como o marido que é pouco amistoso com a amiga da esposa, em geral respondem com desculpas variadas sobre por que deveriam ser auxiliados a sair de uma dificuldade. Praticamente nunca retrucam com algo como: “Vá para o inferno você e esse seu conceito de comportamento correto”.

O que temos aqui é bastante peculiar: o conceito de certo e errado aparenta ser universal entre todos os membros da espécie humana (apesar de sua prática poder resultar em conseqüências brutalmente diferentes). Assim, isso parece mais a abordagem de um fenômeno do que de uma lei, como a lei da gravidade ou a da relatividade especial. Contudo, trata-se de uma lei que, sejamos sinceros, é infringida com uma freqüência impressionante.

Até onde posso dizer da melhor maneira, essa lei parece aplicar-se especialmente aos seres humanos. Embora outros animais possam, às vezes, aparentar demonstrações de vislumbre de um sentido de moral, sem dúvida estas não são amplamente difundidas e, em muitos exemplos, o comportamento de outras espécies parece contrastar dramaticamente com qualquer senso de justiça universal. Ao tentar enumerar as qualidades especiais do Homo sapiens, os cientistas geralmente se referem à consciência de certo e errado, juntamente com o desenvolvimento da linguagem, a consciência do “eu” e a capacidade de imaginar o futuro.

No entanto, será essa noção de certo e errado uma qualidade essencial do ser humano ou apenas uma conseqüência de tradições culturais? Alguns alegam que as culturas apresentam normas de comportamento com tantas diferenças que qualquer conclusão sobre uma Lei Moral compartilhada não tem fundamento. Lewis, estudioso de várias culturas, chama isso de

Uma mentira, uma mentira boa e retumbante. Se um homem for a uma biblioteca e passar alguns dias com a Encyclopedia of Religion and Ethics [Enciclopédia de religião e ética], logo perceberá a imensa unanimidade do fundamento prático no ser humano. Desde os Hinos Babilônicos a Pitágoras de Samos, desde as leis de Manu, o Livro dos Mortos, os Analectos de Confúcio, os Estóicos, os Platonistas, desde os aborígenes australianos e peles-vermelhas dos Estados Unidos, esse homem na biblioteca fará um apanhado das mesmas denúncias triunfantemente monótonas de opressão, assassinato, traição e falsidade; as mesmas obrigações de gentileza aos idosos, aos jovens e aos fracos, sobre a doação de esmolas e a imparcialidade e a honestidade.

Em certas culturas incomuns, a lei assume adornos surpreendentes – vejam-se as bruxas que eram queimadas nos Estados Unidos, no século XVII. Contudo, num exame mais apurado, percebe-se que essas aberrações aparentes surgem de conclusões sustentadas com muita ênfase, mas mal orientadas, sobre quem ou o que é o bem ou o mal. Se você tivesse convicção de que uma bruxa fosse a encarnação do mal sobre a terra, um apóstolo do demônio, não lhe pareceria justificável esse tipo de ação drástica?

Permita-me interromper o raciocínio para salientar que a conclusão sobre a existência da Lei Moral encontra-se em conflito sério com a filosofia pós-moderna. Esta argumenta não haver um certo e um errado absolutos, e que todas as decisões éticas são relativas. Essa visão, que parece amplamente divulgada entre os filósofos modernos, mas que empresta uma mística à maioria de seus membros junto ao público em geral, encontra uma série de situações lógicas no estilo “se correr o bicho pega, se ficar o bicho come”. Se não há verdade absoluta, será que o próprio pós-modernismo é real? De fato, se não existe nem certo nem errado, não há motivos para discutir a disciplina da ética.

Alguns irão contestar, dizendo que a Lei Moral é uma simples conseqüência das pressões evolucionárias. Essa objeção surge de um novo campo da sociobiologia e tenta fornecer explicações para o comportamento altruísta com base no valor positivo da seleção natural de Darwin. Se pudéssemos apresentar tal argumento como sustentação para a interpretação de diversas exigências da Lei Moral como uma indicação para Deus, teríamos um problema potencial – por isso, vale a pena examinar esse ponto de vista de forma mais detalhada.

Leve em conta um exemplo importante da força que sentimos, oriunda da Lei Moral – o impulso altruísta, a voz da consciência nos chamando a ajudar os outros, mesmo sem receber nada em troca. Nem todas as exigências da Lei Moral se resumem ao altruísmo, é claro; por exemplo, o súbito peso na consciência que alguém sente após uma mínima distorção dos fatos na declaração de imposto de renda não pode ser atribuído à sensação de ter prejudicado outro ser humano identificável.

Primeiramente, vamos deixar claro sobre o que estamos falando. Não entendo o altruísmo como um comportamento do tipo “uma mão lava a outra”, ou seja, praticar a bondade esperando algum benefício em troca. O altruísmo é mais interessante: dar-se sem egoísmo aos outros, com sinceridade, sem nenhuma intenção secundária. Quando vemos a demonstração desse tipo de amor e generosidade, ficamos dominados por surpresa e respeito profundo. Oskar Schindler colocou sua vida em grande risco para proteger mais de mil judeus do extermínio nazista durante a Segunda Guerra Mundial e, por fim, morreu pobre – e todos nós sentimos uma grande admiração por seus atos. Madre Teresa é tida, de modo coerente, como uma das pessoas mais admiradas da época atual, embora sua pobreza auto-imposta e sua dedicação extrema aos enfermos e moribundos em Calcutá sejam um drástico contraponto ao estilo de vida materialista que domina nossa cultura.

Algumas vezes, o altruísmo pode ampliar-se até para circunstâncias em que a pessoa beneficiada pareceria um inimigo visceral. A freira beneditina irmã Joan Chittister narra a seguinte história sufi:

Era uma vez uma idosa que costumava meditar às margens do Ganges. Certa manhã, ao encerrar sua meditação, ela avistou um escorpião flutuando indefeso na forte correnteza. À medida que era arrastado para mais perto, prendeu-se nas raízes que se ramificavam para dentro do rio. O escorpião lutava freneticamente para se libertar, mas cada vez ficava mais emaranhado. Imediatamente a senhora aproximou-se do escorpião que se afogava e este, assim que ela o tocou, cravou-lhe seu ferrão. A mulher afastou a mão, mas, após ter recobrado o equilíbrio, tentou de novo salvar a criatura. Todas as vezes que ela tentava, porém, o ferrão na cauda do animal a atingia com tamanha gravidade que suas mãos sangravam e seu rosto distorcia-se de dor. Um transeunte que via a idosa lutando com o escorpião gritou para ela:

– Qual o seu problema, sua tola? Quer se matar tentando salvar essa coisa feia?

Olhando nos olhos do estranho, ela retrucou:

– Só porque é da natureza do escorpião ferroar, por que eu deveria negar minha própria natureza de salvá-lo?

Talvez esse pareça um exemplo drástico – não há muitos dentre nós que arriscariam a vida para salvar um escorpião. No entanto, a maioria das pessoas, sem dúvida, já experimentou um chamado interno para ajudar um estranho em necessidade mesmo sem nenhuma possível vantagem pessoal. E, se de fato agiu guiada por esse impulso, teve como conseqüência uma sensação confortável de “ter feito a coisa certa”.

C. S. Lewis, em seu destacado livro Os Quatro Amores (clique para baixar), explora ainda mais a natureza desse amor generoso, que ele chama de “ágape”, palavra derivada do grego. O autor salienta que essa forma de amor se distingue das outras três (afeto, amizade e amor romântico), podendo ser mais bem compreendida como vantagem recíproca, e que podemos vê-la destacada em outros animais além de nós.

O ágape, ou o altruísmo, apresenta-se como um importante desafio aos evolucionistas. Trata-se, sinceramente, de um escândalo para o raciocínio reducionista. Não pode ser responsabilizado pelo impulso de se perpetuar dos genes egoístas do indivíduo. Muito pelo contrário: pode levar os seres humanos a realizar sacrifícios que trarão sofrimento pessoal, ferimento ou morte, sem prova alguma de benefício. E, contudo, se examinarmos com cuidado aquela voz interior que às vezes chamamos de consciência, perceberemos que a motivação para a prática desse tipo de amor existe dentro de todos nós, apesar de nossos esforços freqüentes para ignorá-la.

Sociobiólogos como E. O. Wilson tentaram explicar esse comportamento com base em algum benefício reprodutivo indireto para o praticante da ação altruísta. Os argumentos, contudo, rapidamente se tornam um problema. Uma suposição é de que os repetidos comportamentos altruístas de um indivíduo são reconhecidos como atributo positivo na seleção do companheiro. Tal hipótese, entretanto, entra em conflito direto com observações feitas em primatas não-humanos que, em geral, mostram o oposto – por exemplo, a prática do infanticídio por um macaco recém-dominante para limpar o caminho a sua futura ninhada. Um outro argumento é o de que benefícios recíprocos indiretos, oriundos do altruísmo, proporcionaram vantagens ao praticante durante o período da evolução; no entanto, essa explicação não leva em conta a motivação do ser humano para praticar pequenos atos de consciência a respeito dos quais ninguém mais sabe. Um terceiro argumento é o de que o comportamento altruísta entre membros de um grupo beneficia o grupo todo. Como exemplos temos os formigueiros, nos quais operárias estéreis trabalham de maneira árdua e incessante para criar um ambiente onde suas mães possam gerar mais filhos. Esse tipo de altruísmo das formigas, contudo, é prontamente explicado em termos evolucionários pelo fato de os genes que incentivam as formigas operárias estéreis serem exatamente os mesmos que serão transmitidos pela mãe aos irmãos e irmãs que aquelas estão ajudando a criar. Os evolucionistas agora concordam, quase unânimes, que essas conexões de DNA incomuns não se aplicam a populações mais complexas, nas quais a seleção trabalha no indivíduo, não na população. O comportamento limitado da formiga operária, portanto, apresenta uma diferença essencial com relação à voz interior que faz com que eu me sinta compelido a saltar no rio para tentar salvar um estranho que está se afogando, mesmo que eu não seja um bom nadador e possa morrer na tentativa. Além disso, para que o argumento evolucionário referente a benefícios grupais de altruísmo se mantivesse, seria necessário, aparentemente, uma reação oposta, ou seja, a hostilidade a indivíduos que não fizessem parte do grupo. O ágape de Oskar Schindler e Madre Teresa distorce esse tipo de raciocínio. Choca saber que a Lei Moral me pede que salve alguém que está se afogando, mesmo que seja um inimigo.

Se a Lei da Natureza Humana não pode ser explicada sem hesitação como uma ferramenta cultural ou um produto indireto da evolução, como, então, podemos justificar sua presença? Citando Lewis:

Se houver um poder controlador fora do universo, este não poderia apresentar-se a nós como um dos fatos que fazem parte do universo – assim como o arquiteto de uma casa não é, de fato, uma das paredes, ou a escada, ou a lareira dessa casa. A única maneira pela qual podemos esperar que ele se mostre é dentro de nós, como uma influência ou um comando tentando fazer com que nos comportemos de determinado modo. E é isso que encontramos dentro de nós. Sem dúvida, isso não deveria levantar suspeitas?

Ao deparar com esse argumento aos 26 anos, fiquei aturdido com sua lógica. Aqui, oculta em meu coração, tão familiar quanto qualquer coisa na experiência do dia-a-dia, mas agora surgindo na forma de um princípio esclarecedor, essa Lei Moral brilhava com sua luz branca e forte nos recônditos de meu ateísmo infantil, e exigia uma séria consideração sobre sua origem. Estaria Deus olhando de novo para mim?

E, se fosse assim, que tipo de Deus seria? Seria um Deus pela visão deísta, que inventou a Física e a Matemática, começou o universo em movimento há cerca de 14 bilhões de anos e, em seguida, perambulou para longe, a fim de lidar com outros assuntos de maior importância, como Einstein pensava? Não, esse Deus, se eu pudesse percebê-lo em sua totalidade, deveria ser um Deus do ponto de vista dos teístas, um Deus que desejasse algum tipo de relacionamento com essas criaturas especiais denominadas seres humanos e, portanto, tivesse incutido esse seu vislumbre especial em cada um de nós. Poderia ser o Deus de Abraão, mas sem dúvida não seria o Deus de Einstein.

Havia outra conseqüência desse crescente sentimento sobre a natureza de Deus se este, na verdade, era real. A julgar pelos altíssimos padrões da Lei Moral, que eu tinha de reconhecer que infringia regularmente, esse era um Deus sagrado e justo. Ele tinha de ser a personificação da bondade. Tinha de odiar o mal. E não havia motivo para suspeitar que esse Deus fosse benevolente ou misericordioso. O surgimento gradual de minha percepção da existência aceitável de Deus trouxe sentimentos conflitantes: alívio diante da amplitude e da profundidade da existência de tamanha mente e um desânimo profundo ao perceber minhas imperfeições ao examiná-las à luz divina.

Havia começado essa jornada de exploração intelectual porque queria confirmar minha posição como ateu. Isso se converteu em ruínas à medida que a argumentação da Lei Moral (e muitos outros assuntos) obrigou-me a admitir a aceitação da hipótese de Deus. O agnosticismo, que parecia um seguro paraíso de segunda, agora me ameaçava como a grande desculpa que em geral é. A fé em Deus parecia mais racional do que uma dúvida.

Também ficara claro para mim que a ciência, apesar de seus poderes inquestionáveis para desvendar os mistérios do mundo natural, não iria me levar mais adiante na resolução da questão de Deus. Se Deus existe, deve se encontrar fora do mundo natural e, portanto, os instrumentos científicos não são as ferramentas certas para aprender sobre Ele. Em vez disso, como eu estava começando a entender por olhar dentro de meu coração, a prova da existência de Deus teria de vir de outras direções, e a decisão definitiva deveria se basear na fé, não em provas. Ainda perseguido por perturbar as incertezas do caminho que eu havia tomado, eu precisava admitir que começara a aceitar a possibilidade de uma visão de mundo espiritual, incluindo a existência de Deus.

Parecia impossível tanto avançar quanto recuar. Anos depois, encontrei um soneto de Sheldon Vanauken que descrevia com precisão o meu dilema. Suas linhas finais diziam:

Entre o provável e o provado existem hiatos

Uma fenda. Com medo de saltar, permanecemos ridículos.

Então vemos atas de nós o chão afundar e, pior,

Nosso ponto de vista esfacelar-se. O desespero desponta

Nossa única esperança: saltar para o Verbo

Que abre o universo fechado.

Durante muito tempo fiquei parado, tremendo, à beira desse hiato. Por fim, não vendo escapatória, saltei.

Como é possível que um cientista tenha tais convicções? Não seriam as várias alegações da religião incompatíveis com a atitude de um cientista, sempre querendo ver os dados, devoto do estudo da Química, da Física, da Biologia e da Medicina? Ao abrir a porta de minha mente a essas possibilidades espirituais, teria eu começado uma guerra de visões de mundo que me destruiria e, por fim, enfrentaria uma vitória com baixas em ambos os lados?

(Francis S. Collins, A Linguagem de Deus, 6ª Edição, Ed. Gente, págs 28-39)
Leia também:
♦ A Lei Moral 2: Lewis e a lei natural
♦ A Lei Moral 3: O Esplendor da Verdade

29 Responses to A Lei Moral, ou “Como deixar um ateu em maus lençóis”

  1. David says:

    A fonte está no final do artigo.

  2. Esse artigo é seu?

  3. Johne144 says:

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  4. Jorge A. Gomes says:

    A respeito do que foi discutido sobre Deus se apresentar, eu gosto de pensar da seguinte forma (talvez não seja uma forma correta de ver as coisas mas tem sua valia): A partir do momento que você passar a ter Deus como mais alto grau de amor, bondade etc, este passa a se tornar algo irresistível. Assim, se Deus se revelasse, e mesmo que fosse de forma limitada, ainda estaria evidente a sua característica de Altíssimo. Será que alguém pode deliberadamente escolher o menos bom depois de ter experienciado o melhor? Será que Deus poderia falhar às expectativas de alguém que passou a vida duvidado de sua existência? E acho que não.

    Esta deve ser uma forma rasa de ver as coisas para vocês que têm melhor entendimento, mas para mim respondem a muitas perguntas.

  5. Roque says:

    Parabéns pelo site. Deus ab
    encoe

  6. Issamu says:

    Meu amigo, eu é que peço desculpas pelo atrevimento, você não precisava responder, trata-se de uma questão bastante pessoal, que você até já me indicou quando disse “pergunte a si mesmo, ao seu coração. Pergunte a outra ordem de coisas…”, e acaso for por uma experiência pessoal, mesmo que me relate, é muito provável que não me sirva, pois se esta for a única forma de acreditar em Deus, acho que terei de descobrir por mim mesmo. Ainda assim, continuo precisando saber o que fazer para poder ter mais fé em Deus.

    A respeito do que você escreveu no último comentário, sobre o Cristianismo, no que tange a interpretação católica, reconheço que tem me estimulado a fé, eu acredito que o verdadeiro Deus, se realmente existe, é o Deus trinitário descrito na bíblia.

    Só quero deixar claro por qual razão todas as minhas perguntas, eu acredito na possibilidade de Deus existir, mas não o suficiente para querer ir a Igreja e para rezar, até o momento tenho ido a igreja por teimosia, para ver se de alguma maneira aumento minha fé, mas ir a Igreja não está me fornecendo mais motivos para acreditar em Deus, também como as perguntas que fiz para as pessoas nesse meio. Quero crer que Ele exista, porém para que minha mente aceite, preciso de motivos convincentes.

    Apesar das nossas conversas até aqui, ainda não me sinto convencido o suficiente. Aceito qualquer sugestão de livros, artigos, vídeos, dicas, etc. Na verdade o que eu procuro saber é o que faz com que as pessoas acreditem em Deus.

  7. José Carlos says:

    Caro Issamus. Antes de mais desculpe a demora na resposta, espero que ainda continue de vez em quando a dar uma olhada no blog.
    Acho que tem razão, mesmo se Deus se tornar evidente haverá sempre a possibilidade do uso da liberdade para segui-lo ou não. Aliás, a teologia judaica e cristã dizem isso ao falar dos anjos: há anjos que estão com Deus e outros que se recusaram e se rebelaram contra Deus. Não se trata de uma argumentação sobre a existencia ou nao de anjos, mas apenas uma ilação tirada do facto que as duas teologias os admitem e falam assim deles. Logo, mesmo vendo Deus pode-se sempre escolher segui-lo ou não.
    Antes de falar do que sei sobre o que a Biblia e a Igreja dizem sobre o assunto, devo dizer que esta frase que voce comentou é (ou era) uma opinião minha e só isso.
    Quanto à Bíblia (e consequente ensinamento católico) sobre o assunto, o que se diz muitas vezes e em muitos lados é que ver a Deus é morrer, ou seja, em linguagem bíblica, “Ninguem pode ver Deus e ficar vivo”. Esta frase é muito comum em muitos dos livros que constituem a Bíblia. Daqui parte-se para a constatação que Deus não pertence à esfera de coisas deste universo (como diz um santo teologo: se pertencesse não era Deus, pois era limitado como todas as coisas que estão neste universo e inclusivé o próprio universo), daí a impossibilidade de se o ver, de se tornar evidente como as demais coisas, mas manifesta-se no universo através de suas acções . Esta é a experiencia do povo bíblico que conhece Deus não porque o viu – não pode, mas porque experimentou sua acção na sua vida, na sua história.
    S. Paulo numa das cartas que escreve à comunidade de Corinto, a chamada segunda, diz a certa altura isto falando da nossa condição existencial neste mundo: “ Estamos, portanto, cheios de confiança, sabendo que, enquanto habitarmos neste corpo, vivemos como exilados, longe do Senhor, pois caminhamos à luz da fé e não da visão clara. E com esta confiança, preferíamos exilar-nos do corpo para irmos habitar junto do Senhor.”
    Penso que esta é a raiz ou fonte da doutrina da Igreja sobre o assunto e está de acordo com a bíblica mais antiga, ou seja, tira-se o corolário que Deus não faz parte deste mundo pois é desejo do santo sair deste mundo, do físico, desta condição do universo, para ir ter com Deus. E fala tambem por isso da fé e da visão clara, ou seja deste assunto.

    Sobre o que perguntou é mais ou menos tudo o que sei que diz a Bíblia e a doutrina da Igreja Católica, mas o assunto nao se esgota aqui. Agora num outro paragrafo vou lançar algumas coisas assim meio soltas que têm na sua base isto da evidencia e não evidencia de Deus. É conversa sómente.

    O cristianismo vai ainda abrir uma outra “polémica” sobre este assunto da evidencia de Deus e que é a seguinte: é que os cristãos, só eles, dizem que Deus se tornou visivel em Jesus Cristo, ou seja, Cristo é Deus (uma das pessoas da S.S. Trindade) e mostrou-se à humanidade- “Quem me vê, vê o Pai.”, diz Jesus a um dos discípulos – Filipe. Ora isto ainda vai complicar mais toda esta questão da evidencia de Deus, pois o Deus invisivel tornou-se visivel, tornou-se evidente, mas ver Deus em Cristo é um problema ( Um à parte: por isso os cristãos, logo desde os seus primórios, antes de haver divisões em católicos, ortodoxos, evangelicos, etc, etc, fizeram imagens de Cristo e de cenas da vida de Cristo – O bom pastor, Cristo o Senhor de todos, só simplesmente Cristo e até talvez outras que não conheça. A critica que muitos evangelicos fazem à Igreja Católica por ter imagens não tem por isso fundamento, porque Deus se tornou visive em Cristo, daí se poder representar. Logo desde o início era assim e os apóstolos que eram judeus e sabiam muito bem o segundo mandamento (Não farás qualquer imagem minha) não viram mal nenhum no uso de imagens de Cristo, pois eles eram as testemunhas que o Deus invisivel se tinha tornado visivel e como tal capaz de se O representar visivelmente, é algo assim de tão simples. Bem, isto foi só um àparte por causa de uma critica que se faz à Igreja Catolica e Ortodoxa pelo uso das imagens. Os ortodoxos sao ainda mais radicais e profundos na teologia e no uso da imagem para o culto religioso – os iconos e a iconografia, mas isso é outro assunto.) Estava dizendo que o Deus invisivel se tinha tornado visivel em Cristo, como dizem os cristãos e só eles. E isto complica muito as coisas, pois, em Cristo, Deus limitou-se a uma forma e um conteúdo bem limitado – ou seja, adquiriu um corpo com todas as limitações deste, adquiriu uma existencia limitadíssima, Ele que é ilimitado por natureza, para poder ser Deus porque senão nao era Deus, limitou-se brutalmente. Chama-se a isto a Kenósis de Deus, o rebaixamento de Deus em Cristo, a humilhação de Deus em Cristo, que para além de se fazer limitado, ainda se faz existencialmente o mais baixo de todos, um escravo, com morte de escravo, a ponto de morrer pela mao dos que são seus como infame e desprezivel. (só o Amor e a revelação de quem era Deus feita pelo proprio (em Cristo) aos seus discipulos – a Trindade -, que mais tarde na historia da Igreja vai dar lugar a muita reflexão sobre ela, podem explicar este rebaixamento do próprio Deus a esta condição. Trinitariamente não sei como se explica a Kenosis de Deus, pelo amor, um dentro dos muitos modos de se o ver é o seguinte: nós que não podendo chegar a Ele, chegou Ele até nós para nos levar até Ele, à imagem de um pai quando se abaixa ao nivel da criança para a fazer subir até ao colo, até ao seu nivel, levá-la para a segurança e esse sentimento de total amor de estar face a face com seu papá).
    Por causa deste escandalo à mente, à razão que não aceita a limitação de Deus por impossibilidade de essencia, surgiram muitas heresias (erros profundos) sobre Cristo e sua pessoa como Deus. Os apostolos, a Igreja Católica, Ortodoxa, Protestante (evangélica) mantiveram e mantêm sempre firme o que lhe foi revelado desde o início, ainda que não se entenda lá muito bem. Ainda hoje alguns grupos mantêm os erros sobre a pessoa de Cristo, devido ao facto d se ter tornado visivel, logo limitado, – Testemunhas de Jeová, Muçulmanos, Adventistas do Sétimo Dia, gnósticos e neo-gnosticismo – maçonaria e derivados, e provavelmente muitos outros ainda que afirmam que Cristo é apenas uma criatura e não Deus.)

    A ausência da evidência não significa evidência da ausência.
    — Carl Sagan

  8. Issamu says:

    David, José Carlos, agradeço pela atenção e franqueza nos comentários.

    Aquela definição de fé eu havia encontrado num fórum sobre Cristianismo, depois de suas explicações, pesquisei melhor e percebi que trata-se de um definição insustentável, aquilo realmente estava me confundindo. Não pensem que sou conhecedor de livros cristãos e da Bíblia, comecei a me interessar há pouco tempo, sou um aspirante no assunto. Até aqui, me parece muito sólida a doutrina da Igreja Católica Apostólica Romana, mas estou tentando evitar esse debate, meu maior problema é resolver a questão da existência de Deus, de como ter fé em Deus.

    José Carlos,
    A respeito de minha dúvida, por que Deus não se evidência, com sua opinião “Deus quer que cheguemos a Ele na liberdade de uma vontade”, você quer dizer que, se Deus se evidenciar, perderemos essa chance de chegarmos a Ele na liberdade de uma vontade, mas por que você acha isso? Você não acha que ainda teríamos a liberdade de escolher seguir a Deus ou não, mesmo que Ele se evidenciasse?
    Eu gostaria de saber se existe algum trecho na Bíblia ou algum ensinamento católico que fale sobre isso.

    Desculpe se estou perguntando demais, mas é importante para mim, e como não disponho de muito tempo pra ler durante a semana, se não for com ajuda dos outros, vou demorar bastante pra encontrar as respostas que procuro.

  9. Jose Carlos says:

    Ainda sobre o acaso – Para Issamus:
    – Não leve a mal a interpelação assim mais directa e crua, mas Issamus “acredita” mesmo na ultima coisa que expressou sobre o acaso na evolução, sobre as mutações que ocorrem sem “intenção”? O que vou dizer agora não tem muita validade pois os nomes, os termos, somos nós que os damos e eles não fazem as coisas serem diferentes só porque o nome sugere isso. O que quero dizer tem a ver com o termo evolução que na perspetiva indicada perde o seu sentido e até resulta inadequado. O termo evolução não se compagina com o acaso desintencional e no entanto não nos repugna nada usa-lo, pois os dados reveladores de uma progressão nas espécies ao longo do tempo são muito “evidentes”. Evolução indica um caminho, um progresso, algo projetado para conseguir melhor um determinado fim. De facto parece que existe um factor de “progresso” na “tecnologia” das espécies e um caminhar do mais simples ao mais complexo. E se atendermos ao princípio antrópico fraco, então tudo parece indicar que existe o “objetivo” de surgir uma consciência, uma espiritualização da (na) própria matéria através de (um) ser consciente. Parece que este universo está feito para ter vida e vida inteligente. Assim, não me parece que o acaso, na medida em que não tem intenção de provocar seja o que for, e que acontece pontualmente, daí ser acaso, possa vir a dar os resultados observados. Matematicamente o acaso falha. Pelos cálculos estatísticos e suas probabilidades e se existisse só o acaso desintencional, de facto nem nós, nem a vida tinham surgido neste planeta e os próprios planetas também não, nem as estrelas. É impossível matematicamente isso e muito menos a evolução ao ritmo que tem andado. O acaso, nas suas milhentas de possibilidades promove o caos, o nada. É uma equação não resolvida com aspeto de impossibilidade.
    Penso, por outro lado, que uma visão da “desintencionalidade” nos acontecimentos, torna a visão sobre o mundo, o universo bastante redutora. É deixar de olhar para o grande quadro e voltar a visão só para o local e tempo onde nos encontramos, sem averiguarmos mais que um curto presente e um pouco do que está à sua volta. Digo isto baseado no que diz e que pode estar a ser mal entendido – A teoria da evolução não se preocupa em verificar as causas anteriores, desta forma é inevitável interpretar que a palavra acaso, quando citada no prisma da seleção natural das espécies, significa que a mutação ocorreu sem que houvesse a intenção de provocá-la.
    Isto, da maneira como o interpretei, é a sentença de morte daquilo que nos torna humanos, da filosofia, das grandes e principais questões de todas com que sempre nos interrogamos e buscamos resposta, aliás o motivo destas conversas; Quem sou, o que é o universo, de onde venho, para onde vou, existe ou não Deus? Porquê a existência? Qual o seu sentido? A “filosofia” morre com a postura se a evolução é entendida como acaso total e puro e com a perspetiva acima citada, se é isto que entendi.
    É interessante repararmos que no grande quadro, na perspectiva global o acaso não é resposta e que no quadro pequeno, daquelas coisas que vão acontecendo, as pequenas mudanças, a intencionalidade não é resposta.
    Vou ainda interpelar a sua opinião para uma outra possível posição sobre o acaso na evolução, em que não é desprezado mas também não é absolutizado – imagine um vulgar jogo de tabuleiro constituído por casas que possuem características próprias, penalizações, vantagens, avanços, recuos, etc. e fazendo parte desse jogo a presença de um dado que dita aliatoriamente os avanços pelas casas. A mim não me importa tanto para o grande quadro, para as grandes questões os números aleatórios e suas consequências que saem do dado com suas consequências diretas no jogo mas principalmente o facto de haver um dado, um tabuleiro e um jogo que está decorrendo. O dado faz parte do jogo mas não é o jogo, se me faço entender. O jogo todo é mais importante e abrangente que o dado e o dado faz parte dele. No conjunto o dado existe, é importante mas é uma peça. Não é a explicação do jogo. O jogo tem uma intenção que usa a própria “desintencionalidade” objectiva do dado para que possa decorrer.

    Outro assunto.

    – já tinha reparado anteriormente, nos seus diálogos com David, nesta afirmação que acho que merece uma abordagem: “segundo o Cristianismo, a fé acompanha absoluta abstinência à dúvida, ou seja, é impossível duvidar e ter fé ao mesmo tempo”. Sobre isto devo dizer em primeiro lugar que o termo “cristianismo” é muito díspar atualmente, o cristianismo da maior parte dos evangelicos émuito distinto do catolicismo e de outros cristianismos em muitas matérias, sendo esta uma delas. O catolicismo e os ortodoxos, herdeiros e continuadores da primeira Igreja, aquela primeira que dialogou com o mundo e cultura helenica, não diz o que afirmou sobre dúvida e fé, aliás, a Igreja compreende muito bem a duvida e sabe qual o seu lugar e importancia na questão do crer. Só uma fé muito superficial, por vezes enganadora e alienante, que há, é que afirma isto. A primeira prova (tentação)de Cristo na sua vida – no deserto foi exactamente a duvida – “Se és filho de Deus, então…”. Os apelos e interpelações de Cristo aos discipulos sobre as suas duvidas e consequente falta de fé são uma constante nos evangelhos. Penso, e o cristianismo catolico e ortodoxo dizem, que é errado pensarmos em dois termos opostos em que um exclui o outro neste campo da fé e da duvida. Os crentes não têm uma certeza absoluta de sua fé, esta tem e apresenta-se com muitas sombras (duvidas), tal como os não crentes que na sua não crença, se assim se pode dizer, têm tambem muitas dúvidas. Um velho professor meu costumava dizer-nos esta grande verdade em modos de brincadeira: “O crente todos os dias pede a Deus para não deixar de acreditar e o ateu para não começar a acreditar”. O proprio Cristo nos evangelhos fala disto da fé e de graus nela ( “Se tivesseis fé do tamanho de um grão de mostarda…, diz também os evangelhos que os discípulos pediam para que Ele lhes aumentasse a fé; diz ainda S. Paulo, já no fim de sua vida: “Guardei a fé.”) A fé não é um crer numa evidencia que tira toda a sombra duvida, porque as evidencias não se crêem, são evidentes e impõem-se ao sujeito (este é assunto que voce toca no primeiro paragrafo com David quando pergunta porque Deus quer que tenhamos duvidas sobre sua existência). Só nas evidências podemos ver em termos radicais e de exclusividade (é ou não é, tem ou não tem). A fé em Deus opera noutro campo que não o da evidência e por isso a duvida está lá sempre presente. Deus não se pode evidenciar, mesmo que quase tudo indique a sua existência há sempre uma possibilidade de duvidar, de não ser assim. A fé é gradiente.
    Deus, tal como David disse, não se pode provar totalmente porque não é uma evidência e não está na classe ou campo das evidencias, então porque não se evidencia? No fundo acho que é aquilo que Issamus pergunta porque Deus não faz um milagre? Vou interpela-lo uma vez mais: Mesmo que Deus fizesse um milagre, e os faz, acha que isso provaria sua existência? Nem isso (Lhe) seria favorável para provar sua existência, pois pode-se interpretar o milagre sempre de outra forma, é sempre possivel pensar que pode pertencer a outra ordem de coisas e não a Deus. O milagre não se explica, por isso é milagre, e por isso relativamente a eles estamos com um problema semelhante, por exemplo, ao da origem do universo. (É neste sentido que para os cristãos o universo é um milagre de Deus). Mas se mesmo o milagre não serve de prova total de Deus, e não serve mesmo enquanto total então, e voltando ao mesmo, só a evidencia de Deus pode tirar qualquer duvida sobre sua existencia. (A evidencia não só tirará as duvidas como tirará e acabará também com a fé. Essa é a doutrina da Igreja relativamente ao destino final da nossa existencia: a visão de Deus, e aí, como diz S. Paulo, terminarão a fé e a esperança, só permanecerá o amor.)
    Indo agora mais directo à sua pergunta, espero, então porque não se evidencia Deus? Talvez possamos responder que Deus não pertence à ordem deste mundo e como tal não pode manifestar-se nele como as coisas deste mundo se manifestam, o que faria sua existência aqui neste universo algo completamente impossível de apreender pelos sentidos como objecto. (Porém os cristãos, (mas não todos), dizem que Deus se manifestou mesmo visivelmente no mundo, tendo para isso de fazer-se um igual a nós – Jesus Cristo, o Emanuel, que significa Deus connosco. É isto que dizem os cristãos; mas não todos, existiram e existem uns que para salvaguardar esta impossibilidade do divino se manifestar no nosso universo limitado, porque não pertence a esta ordem de coisas nem às limitações, afirmaram e afirmam que Cristo era (é) apenas uma aparência, uma ilusão criada pelo poder de Deus – chama-se a esta teoria (heresia) de docetismo.)
    Se Deus não é uma evidência aos sentidos, também não é uma evidência racional (o motivo de toda esta conversa de Issamus com David e na qual me intrometi). Para ser uma evidência racional teria de pertencer à classe dos raciocínios dedutivos ou à classe das tautologias que nos dão garantias de 100% de fiabilidade na conclusão do raciocínio. Mas os raciocínios sobre Deus (as vias são um exemplo de raciocínios sobre Deus) não pertencem a estas ordens de raciocínios, pertencem aos indutivos e aos de analogia, que dão como prováveis suas conclusões, por vezes com bastante probabilidade (75%) como é no caso dos indutivos e outras com menos e mais fragilidade como são os analógicos. As vias de S. Tomás não são raciocínios do tipo 100% fiáveis, não são silogismos categóricos dedutivos, nem tautologias. Por isso têm sempre esta maior ou menor carga de duvida, por um lado é sempre possível e mais provavel concluir assim, como é possível, ainda que menos, não concluir assim.
    E porque é assim então? Porque Deus não se evidencia, nem sequer à razão? Ouso uma resposta minha sobre a questão.
    Resumindo:
    1º Deus não é evidente em nenhum campo.
    2º Mas Deus é possível, aliás, por lógica de certos raciocínios, é mais provável Deus que não Deus.
    Eu acho que Deus fechou tudo sobre Ele na liberdade, para que se dê a liberdade. Crer é um acto de liberdade no fundo, é uma opção, não cega, tem suas razões e tem que ter, mas não totais (evidentes), nalguns casos são mesmo bastante fortes, noutros mais fracas, mas tem de exigir uma opção, acho eu. Deus quer que cheguemos a Ele na liberdade de uma vontade, de o querermos e aí se manifesta, (este é o testemunho daqueles que creem n’Ele. Por isso o assunto Deus faz mais parte do mundo dos testemunhos, daquilo que experimentamos e dizemos mesmo não compreendendo muito bem todos os campos envolvidos mas que sabemos que existe e que não estamos loucos, do que de campos mais científicos, mais evidentes, mas isso não quer dizer que destes campos esteja dispensado, isso é um erro).
    Esta é a historia do povo de Israel que conhece e se relaciona com um Deus que se propõe a eles e que lhes pede uma opção. Esta é a historia daquela figura que simboliza a fé, que é Abraão, que teve de optar e arriscar perante uma proposta meio louca com muitas duvidas possiveis. Penso que Deus quer que o descubramos não na evidencia mas sim na relação de fé e de acreditar nele como um Deus pessoal, capaz de relação, e de um crédito que lhe damos ( a palavra acreditar tem a haver com esta de crédito) como se faz com alguem a quem amamos (amigo, mulher, etc.) em que temos de dar um credito pois a duvida é sempre possivel. A fé cristã trabalha muito, mas muito mais neste campo das relações do que no campo da racionalidade. (Mais um aparte: repetindo, para os cristãos Jesus, um homem, é Deus; mas não é evidente isto, nem por sombras como se costuma dizer por cá, não é uma evidência. O próprio Jesus estava oculto pela fé (havia e há que ter fé nele), morreu por causa disto mesmo, porque ele disse descaradamente que era Deus, uma blasfémia enorme para os judaísmo, mas para ver Deus naquele homem é preciso fé, nem os milagres foram evidencias para muitos judeus, atribuíam a outra ordem, puseram em causa os milagres dele. O próprio Jesus tem em si esta caracteristica do problema do divino, de não ser evidente e de precisar da fé para se chegar a Ele). Se reparar, mesmo que aceitemos as vias de S. Tomás elas não falam do Deus bíblico, do Deus dos cristãos, da fé cristã como ela é. Elas falam do Deus criador que como uma das hipoteses até se pode confundir com o proprio universo. Aliás, nas suas conversas com David, me pareceu por certas questões suas que é uma pessoa crente, mas um crente que até pode acreditar que o proprio universo seja deus, (universo eterno e único, “criador” de si mesmo.) As vias não lhe dão a resposta que o Deus que está por detrás de tudo como uma opção lógica bem possivel e provável seja o bíblico. Quando voce colocou a hipotese de o universo se justificar a si proprio ao comentar as vias, sua postura perante isto foi correcta. Voltando ao assunto do cristianismo e de sua fé que é mais existencial que racional, mas que está imbuida de muita racionalidade, mas não de uma racionalidade de evidência, penso que Deus encerrou tudo na fé, no crer e no querer relativamente a Ele.
    Mas como poderei eu optar por algo que pode, muito ou pouco, até não existir mesmo? Eu acho que só se pode “responder” a isso com o argumento maternal, aquelas conversas que as mães por vezes têm connosco: pergunte a si mesmo, ao seu coração. Pergunte a outra ordem de coisas, porque existe essa ordem diferente que dá também respostas muito certas, às vezes não se vendo as suas logicas ou sendo muito entendíveis, mas que são muito certas, muito intuitivas, porque de evidencia, de uma certeza absoluta total sem que se projete qualquer panorama de duvida sobre Deus aí não obterá o pretendido por característica própria do objeto focado. Tão pouco ninguém lhe exporá nunca um Deus evidente, e se alguém o fizer desconfie, duvide, porque até a lei moral do Universo podemos colocar em causa com razões.

  10. Issamu says:

    David, conforme disseste, se nem Deus nem o ateísmo podem ser provados, por que Deus quer que tenhamos dúvida quanto a sua existência?
    Foi por este motivo que fiz a primeira pergunta, para aquele que não consegue ter fé, e quer saber se Deus existe, por que Deus não opera um milagre?

    Então você diz que é preciso escolher entre as duas possibilidades, neste caso seria como uma aposta, mesmo que eu veja uma chance muito maior para um dos lados, a menor chance que resta em minha mente eu continuo a considerar. Não é como saltar para o Verbo, como diz no final do artigo, a não ser que esse saltar fosse imediatamente comprovado após a escolha, mas em tese só saberemos com certeza se Deus existe depois da morte, e iremos continuar considerando essa dúvida até o fim da vida terrena. É aqui que está o nosso embate: segundo o Cristianismo, a fé acompanha absoluta abstinência à dúvida, ou seja, é impossível duvidar e ter fé ao mesmo tempo.

    O maior problema é que não se trata de uma escolha simples, é apostar tudo o que temos, apostar a própria vida, por isso concordo com a definição de fé segundo o Cristianismo, é preciso ter certeza, não é fácil entregar minha vida aos outros e a Deus, como ensinou Cristo, sem ter certeza do que estou fazendo. Pelo menos para mim é muito difícil aplicar os ensinamentos de Cristo sem ter plena confiança de que não é tudo a toa.

    Mas como posso ter certeza de algo que é uma possibilidade?

    Sobre o pensamento humano, é uma característica única e que nos diferencia do resto dos animais. Certos animais, como primatas, golfinhos, conseguem executar uma variedade de tarefas, mas deste ponto até a complexidade do pensamento humano é um salto colossal. A Lei moral é o maior indício de que o pensamento humano deve ter algo de espiritual, mas também pode ser explicada pela teoria da evolução. Esta última pode ter vários falhas, mas não considero um absurdo, ela é aceitável.

    Sobre o acaso, existe mais de uma interpretação para esta palavra. 1. podemos considerar que trata-se de acaso todo fenômeno que é incausado, que não teve um fenômeno antecessor que o causou. 2. trata-se de algo que foi causado por outro fenômeno antecessor e este, por sua vez, não tinha intenção de causar qualquer coisa.

    Quanto a sua pergunta, Jose Carlos: “Se não existe de facto e se ele aí está só como uma palavra que sintetiza a limitação humana em entender todas as variaveis de um assunto e que não passa disso, porque o deixamos então intervir nos assuntos a ponto de os influenciar com sua expressão irracional?”

    O acaso segundo a interpretação 1 é irracional, concordo contigo, porém se escolhermos a interpretação 2 me parece ser bem racional, ele é aparente em nossa vida, quando sofremos um acidente de carro, ou encontramos um conhecido na rua, ou quando jogamos dados, você pode levantar uma série de causas que poderiam ter levado a isso, mas não conseguirá estabelecer que a causa tinha por finalidade aquele efeito específico.

    A teoria da evolução não se preocupa em verificar as causas anteriores, desta forma é inevitável interpretar que a palavra acaso, quando citada no prisma da seleção natural das espécies, significa que a mutação ocorreu sem que houvesse a intenção de provocá-la.

  11. David says:

    Interessante isso do acaso, José Carlos. Eu chutaria que o que chamamos de acaso são uma infinidade de cadeias causais entrelaçadas que não podemos determinar. Deve ser um dos argumentos dos ateus e evolucionistas: jogue porrilhões de cadeias causais em alguns bilhões de anos e… pufff! Tudo se explicaria, dado o grande número de entrelaçamentos: a galáxia, o sistema solar, o planeta Terra, a vida, a vida inteligente. Algo como a idéia da sopa de letrinhas derramada durante milhões de anos que em algum momento produziria uma obra de Shakespeare.
    Bem, como eu escrevi antes, isso também é matéria de fé, e acho mais plausível acreditar na inteligência ordenadora que em tal coisa. Mas, por outro lado, uma tal cadeia causal nos levaria de volta às vias de Tomás.
    É claro que uma tal definição de “acaso” mostraria justamente que o tal “acaso” não existe. Um acaso que seja acaso mesmo não sei como seria possível.
    Esperemos a opinião do Issamu, mas seria interessante também a sua, já que você colocou a questão mas não manifestou sua própria opinião.

  12. Jose Carlos says:

    tenho assistido por fora a esta interessante e honesta questão por parte de seus intervenientes e tenho gostado do que vejo aqui expresso. Gostaria de perguntar a Issamu e tambem a David algo sobre o acaso, que nestes campos aparece como um dos jogadores principais e mais importantes, se me é permitida a analogia. A pergunta é simples: estará o acaso provado como algo existente? nos computadores não é acaso puro o seu random. matematicamente ouvi falar de uma expressão, que é um dos problemas insoluveis da matematica que se for soluvel explicará o acaso, mas até agora não o foi e é tido como insoluvel. tenho pena de nao o poder expressar, por isso disse que ouvi de fonte segura nisso. Einstein dizia que Deus nao brincava com os dados. E ainda pergunto, se nós tivermos conhecimento total de todas as variaveis que entram em jogo numa coisa nao saberemos com exactidão o resultado dessa coisa antes de acontecer? por isso penso que a pergunta é viavel e pertinente. Existe de facto o acaso? Se não existe de facto e se ele aí está só como uma palavra que sintetiza a limitação humana em entender todas as variaveis de um assunto e que não passa disso, porque o deixamos então intervir nos assuntos a ponto de os influenciar com sua expressão irracional? Não estará o acaso na mesma posição para os ateus que Deus para os crentes? Um conceito explicativo de algo, de uma postura, mas nao provavel, impossivel de provar? E esta é a minha opinião: em termos de solução acho a de Deus muito mais racional e com sentido que a do acaso que roça sempre no final o absurdo, o nada e o sem sentido.
    Mas o que importa nisto mesmo é a pergunta inicial: existe o acaso?

  13. David says:

    Sim, concordo em descartar a ciência como meio de prova. Na verdade citei o fato científico da expansão do universo por me parecer que leva a conclusões mais plausíveis. Teorias científicas existem aos milhares e não será por aí que chegaremos a bom termo.
    Porém, temos que encontrar, para que haja uma discussão proveitosa para ambos, uma base sólida aceita por ambas as partes. A rigor, pode-se negar qualquer coisa, uma vez que nem tudo pode ser provado. Podemos provar que uma coisa é igual a si mesma? Podemos provar que unicórnios azuis de chifre dourado não existem? Afinal, como poderíamos provar isso se não conhecemos todo o universo? Até mesmo o conhecimento científico implica, no fundo, a um ato de fé, pois necessita da crença em bases que não podem ser provadas.
    Dito isto, podemos voltar às 5 vias e outros aspectos:

    1. Uma vez que você diz concordar que nada pode mover-se por si mesmo, conclui dizendo que talvez essa partícula original não fosse imóvel ou estivesse estável. Mas então resta explicar esse mesmo movimento. Se ela originalmente estivesse em movimento, este teria também que ter uma origem externa, uma causa fora dessa mesma partícula. Se há a necessidade de um primeiro motor imóvel, certamente que essa condição não seria satisfeita por essa partícula. Não seria, pois, a origem de tudo.

    2. O problema da ordem devida a uma inteligência ou ao acaso continua. Nesse caso, devo dizer que também atribuir a ordem ao acaso é uma crença, uma fé. Eu não posso provar a um ateu que tudo vem de Deus, MAS ELE TAMBÉM NÃO PODE ME PROVAR QUE É OBRA DO ACASO! Assim, considerando o universo, a vida, a complexidade das coisas, a inteligência criadora do homem, etc., acho muito mais plausível a crença em um Deus inteligente criador que um acaso criador. Mas ambos são crenças. Mas aí te deixo numa difícil encruzilhada onde não há meio termo: qual das crenças você escolhe? Se parece tão difícil acreditar em Deus, me parece que é muito mais difícil não crer nele. A inteligência operando nos é comum, mas… o acaso? E também Tomás parte…

    3. Tenho que sair, estou super atrasado e não dá para terminar a contento. Escrevi também com certa pressa, então perdoe se houver erros que não percebi, ou se não consegui me fazer entender. Deixo, porém, uma última idéia para desenvolver depois: a realidade não pode ser somente material, é necessário que exista uma realidade espiritual também. O pensamento, por exemplo. Que pensa disso?
    Abraço.
    David

  14. Issamu says:

    David.

    citando suas palavras: “basta somente o que já é conhecido e aceito pela ciência para que fique evidente que o universo não existiu sempre”.
    Neste ponto acredito que está o equívoco. 1º, existe a possibilidade do universo não estar em expansão, apesar do big bang ser a teoria dominante, existe a possibilidade desta expansão ser apenas um fenômeno regional. 2º A teoria do Big Crunch, o universo poderia estar se contraindo e se expandindo desde sempre, pelo princípio da elasticidade gravitacional. Apesar da observação que o nosso universo está se expandindo cada vez mais, essa observação não é conclusiva, existem muitos mistérios a respeito do nosso universo e talvez a física nos supostos universos anteriores fosse diferente. 3º Teoria das cordas. O nosso universo poderia ter surgido de outra dimensão.

    Prefiro não entrar muito em detalhes, mas essas teorias, apesar de extremamente especulativas, são possíveis. E quando você diz que é evidente que o universo nem sempre existiu, mas o que os cientistas dizem a respeito do universo, na verdade, nunca são certezas, são no máximo grandes probabilidades.

    Como eu havia colocado, concordo que um motor imóvel não pode mover a si mesmo, isso definitivamente eliminaria a hipótese da partícula super sólida – descrita na teoria do big bang – se fosse em algum momento imóvel, de ter explodido a si mesma e criado o universo. Mas essa partícula poderia não estar estável ou imóvel.

    A respeito da segunda lei da termodinâmica, repare na definição onde diz sistema isolado, o equívoco está em considerar esta lei para um sistema aberto. Entropia nada tem haver com complexidade de sistemas, com causalidade em geral ou com organização que não seja a nível de partículas.
    Existe uma matéria bastante completa aqui: http://evolucionismo.org/profiles/blog/show?id=2393347%3ABlogPost%3A6617

    Quando falei sobre a fé, eu quis dizer que é preciso ter certeza da existência de Deus para ter fé. E para isso, é preciso ter certeza que essas teorias que discutimos são impossíveis. Você consegue afirmar que é impossível a vida ter surgido por acaso? Consegue afirmar que é impossível o universo ter sempre existido?

    Talvez a única coisa impossível seja dizer que algo é impossível, com exceção desta frase, é claro, hehe. Mas observe que quanto mais a inteligência humana desvenda o desconhecido, mais encontra incoerências, como é o problema da gravitação quântica, o mistério sobre a energia escura ou o caso da divisão do átomo, depois de divido em prótons, nêutrons e elétrons, e os prótons e nêutrons divididos em quarks. Tal divisão pode repetir-se infinitamente, pois, ao chegar na última partícula (aquela que, supostamente, seria a indivisível), como saber que ela não seria, também, divisível?

  15. David says:

    Não precisa se desculpar. Seu questionamento é muito interessante e pertinente.
    Não vou responder a cada via de Sto. Tomás, pois não é necessário. Afinal, basta que apenas uma esteja correta para que a demonstração se dê, não?
    Primeiramente, acho que há uma inversão de sua parte no que diz respeito à fé. Não é necessário acreditar em Sto. Tomás pela fé. Ao contrário, o que Tomás faz é uma demonstração RACIONAL, e não pela fé. E você mesmo apela à razão quando escreve “Se você me fornecer argumentos que me convençam…” e “Vou continuar procurando razões que me convençam…”. É isso que Tomás faz, a saber, demonstrações racionais que não precisam da fé para serem verificadas. Tomás parte das realidades sensíveis para tirar suas conclusões. Veja como ele inicia a explicação das 2 primeiras vias: “Nossos sentidos atestam, com toda certeza…” e “Encontramos nas realidades sensíveis…”. Ora, para verificar isso não é necessário ter fé.

    Quanto às 5 vias…

    – Você concorda em que é necessário um primeiro motor e uma primeira causa. A RAZÃO lhe diz isso. Sua objeção é a de que, a seu ver, o universo poderia preencher esse papel. No entanto, isso não é possível.
    O universo é COMPOSTO, formado por partes, e cada uma delas tem suas causas e causa efeitos em outras, é movida e move. Assim, não pode de maneira alguma ser uma primeira causa incausada ou primeiro motor imóvel. Tomás parte exatamente da constatação do movimento e da causalidade que observamos na realidade (esse mesmo universo observado) para chegar à conclusão da necessidade da primeira causa incausada e do primeiro motor imóvel, já que essa causalidade não pode ir ao infinito.

    – Como explica Tomás que “tudo o que é movido, é movido por outro”, também o universo não pode ser movente e movido ao mesmo tempo, ou seja, causa de seu próprio movimento. Veja o que ele diz na Suma contra os gentios: “Nenhuma coisa está simultaneamente e sob o mesmo aspecto em ato e potência. Porém, tudo aquilo que é movido, enquanto se move, está em potência, porque o movimento é ato daquilo que existe em potência enquanto está em potência. Tudo aquilo que se move está em ato enquanto é movente, pois nada age senão enquanto está em ato. Logo, nada está, com referência ao mesmo movimento, como movente e movido. Logo, nada se move a si mesmo.”

    – Também a ciência demonstra que o universo não existiu sempre, mas, ao contrário, que estando em expansão, teve um princípio. Como não conseguem ainda explicar esse princípio, o chamam de “uma singularidade”, algo que não se consegue resolver com as leis físicas conhecidas hoje. No entanto, basta somente o que já é conhecido e aceito pela ciência para que fique evidente que o universo não existiu sempre. Veja este texto sobre o famoso Big Bang: “Os cosmólogos usam o termo “Big Bang” para se referir à ideia de que o universo estava originalmente muito quente e denso em algum tempo finito no passado e, desde então tem se resfriado pela expansão ao estado diluído atual e continua em expansão atualmente. A teoria é sustentada por explicações mais completas e precisas a partir de evidências científicas disponíveis e da observação. De acordo com as melhores medições disponíveis em 2010, as condições iniciais ocorreram por volta de 13,3 a 13,9 bilhões de anos atrás.” (Fonte: Wiki)
    E a expansão do universo é fato. Se quiser, dê uma olhada neste texto: http://www.if.ufrgs.br/~fatima/ead/expansao-cosmologia.pdf

    – Finalmente, o problema da ordem no universo. Você cita a teoria da evolução. Pois bem, essa teoria não passa disso, uma… teoria! Há muitos aspectos que considero válidos e plausíveis, por exemplo, acreditar que pequenas mutações possam favorecer a sobrevivência de determinados indivíduos de uma espécie, mas essa teoria levada ao absoluto é simplesmente absurda. Se houvesse uma “lei” da evolução, explique-me: de onde viria essa lei? A simples existência de uma “lei evolutiva” no universo remeteria necessariamente a uma instância superior a este mesmo universo. E caso assim não fosse, teria que dar-se necessariamente pelo acaso, e aí já não seria uma “lei da evolução”. Ora, para mim creditar ao acaso um tal nível de ordenamento do universo parece mais absurdo ainda.
    Em termos científicos, a coisa fica mais clara ainda segundo a segunda lei da termodinâmica. Veja:
    “A segunda lei da termodinâmica ou segundo princípio da termodinâmica expressa, de uma forma concisa, que “A quantidade de entropia (grau de desordem) de qualquer sistema isolado termodinamicamente tende a incrementar-se com o tempo, até alcançar um valor máximo”.
    Assim, na natureza entregue a si mesma, o grau de desordem deve necessariamente crescer, e não evoluir para formas cada vez mais complexas até o surgimento da vida (com seres de uma complexidade incrível) e da vida inteligente e racional.

    Bem, por enquanto é só, mas sinta-se livre para continuar o debate. É bom pensar e é bom pensar nessas coisas.
    Abraço
    David

  16. Issamu says:

    David,

    obrigado por ter me respondido e desculpe pela demora. O cristianismo define que não pode haver dúvida na fé, temos que estar 100% certos que Deus existe, ou não temos fé.
    A palavra que São Tomás usa é demonstração da existência de Deus, devido a definição de fé, sou obrigado a tomar a interpretação de que essa demonstração é convincente, porque para eu ter fé, não posso ter a menor dúvida. Assim, não pode haver uma hipótese convincente que possibilite que a informação seja falsa.
    No link que você colocou São Tomás diz “a existência de Deus é demonstrável pelos efeitos que conhecemos.”, e essa demonstração ele descreve nas “5 vias para demonstrar a existência de Deus”.
    O problema que encontro, David, é que não consigo deixar de encontrar hipóteses que invalidam estas vias, a ver.
    1ª via: “é preciso ter um 1º motor”. Concordo com São Tomás nesta via, porque podemos facilmente considerar falsa a hipótese de algo surgir do nada. Ou seja, é preciso que algo tenha sempre existido, mas ainda permanece a hipótese do próprio universo ter sempre existido.
    2ª via: “é preciso ter uma causa primeira por ninguém causada”, aqui podemos levantar a mesma hipótese do próprio universo ter sempre existido, então não seria necessária uma causa primeira para o surgimento do universo, porque ele teria sempre existido.
    3ª via: Ele diz que é preciso um ser(Deus) que fundamente a existência dos seres incontingentes, senão o mundo deixaria de existir, o problema é que esta é uma afirmação sem justificativa, qualquer um poderia afirmar em contrapartida que o mundo existe por acaso, sem precisar justificar, já que São Tomás também não justificou sua afirmação. Alguns cientistas consideram que um ser pode surgir a partir de um não ser.
    4ª via: nesta via Tomás pressupõe que exista a perfeição nos seres, devido alguns serem mais próximos da perfeição que outros, mas não vejo onde a existência de graus de aproximação da perfeição acarrete na existência da perfeição. Novamente, qual o embasamento para esta afirmação? Mesmo que consideremos que qualquer graduação pressupõe um parâmetro máximo, o que o levou a considerar que existe um ser com padrão máximo de perfeição?
    5ª via: “inteligência ordenadora”: vejo aqui a seguinte questão, como a ordem pode nascer da desordem? A teoria da evolução diz exatamente isso, que a ordem pode nascer da desordem. Se você me fornecer argumentos que me convençam que essa teoria é um absurdo e deve ser totalmente descartada sua possibilidade, acredito que ficarei convencido.

    Eu vejo 3 razões principais que indicam a existência de Deus, 1ª: a Lei moral; 2ª o fato da ciência, apesar dos últimos avanços na genética, não ter conseguido gerar vida através de substâncias inanimadas; e 3ª: a ignorância da ciência a respeito do surgimento do universo.
    Apesar da inteligência humana ainda não ser capaz de responder satisfatoriamente estas questões, suas teorias tem possibilidade de estarem certas.

    As razões para a existência de Deus tem muita força em minha mente, mas não tenho certeza, como posso rezar só por achar que Deus existe?
    Vou continuar procurando razões que me convençam da existência de Deus, porém minha dúvida ainda permanece: para aquele que não consegue ter fé, e quer saber se Deus existe, por que Deus não opera um milagre?

  17. David says:

    O que segue é apenas minha opinião.
    Não acredito que o “descobrir Deus” se dê pelos milagres. Eu acho que os milagres servem mais para apoiar a pregação e o anúncio de Cristo ressuscitado, pois é por Ele que nos foi dada a salvação. Assim, quando e para quem acontecem os milagres é coisa que cabe a Deus, a nós cabendo apenas, pela fé, aceitar seus desígnios sabendo que tudo o que Deus faz é bem feito.
    Quanto a Deus, não podemos vê-lo em sua essência, mas, segundo Tomás, ele pode ser demonstrado pelos seus efeitos. Dê uma olhada no artigo 2 da questão 2 da 1ª parte: “É possível demonstrar a existência de Deus?”.
    Em seguida (art. 3), Tomás nos apresenta as famosas 5 vias para demonstrar a existência de Deus.
    Eu particularmente ainda não encontrei nenhuma refutação convincente para a necessidade de uma primeiro motor ou de uma primeira causa incausada, e se juntarmos a isso o fato (eis aí um fato!) da extrema ordem do universo (para mim a hipótese de tudo ser obra do acaso soa absurda), eis que Deus se apresenta como verdadeira necessidade, e já não mais como hipótese.

  18. Issamu says:

    Quando eu disse “fatos que fazem parte do universo”, usei as mesmas palavras que estão na última citação de Lewis neste artigo, é o mesmo que o nosso mundo material.
    Li a Suma, e como tu disseste, Deus se apresenta como fato, que são os milagres. Mas mesmo os milagres mais inexplicáveis registrados, não refutam a possibilidade de terem sido inventados.
    Os milagres são para poucos, aos demais resta acreditar em Deus através da fé. Esta é minha dúvida: para aquele que não consegue ter fé, e quer saber se Deus existe, por que Deus não opera um milagre?

  19. David says:

    1. Não entendi bem o que quer dizer com “como um dos fatos que fazem parte do universo”. O universo é criado, e Deus não. Nesse sentido, Deus não é “parte” do universo, mas, ao contrário, seu criador.
    2. Entendendo sua frase como “parte da realidade”, pode-se dizer que ele se apresenta, sim, como fato, como realidade, porém ele se apresenta como ele é, ou seja, como Deus. Quanto a isso recomendo a leitura das questões iniciais da primeira parte da Suma (3 a 26), que tratam de Deus em si: a simplicidade de Deus, a perfeição de Deus, a bondade de Deus, a existência de Deus nas coisas, como conhecemos Deus, a vida de Deus, etc.
    Abraço.

  20. Issamu says:

    Então existem 2 hipóteses para explicar a origem da Lei Moral: ela foi instituída por Deus, ou é um produto da evolução. E depois cita C. S. Lewis para justificar a origem dessa Lei Moral, onde ele diz que Deus só poderia se mostrar dentro de nós.
    Mas isto não invalida a possibilidade evolucionária, pois se a Lei Moral fosse um produto da evolução, da mesma forma ela só poderia se mostrar dentro de nós.
    A minha dúvida é: por que Deus não poderia apresentar-se a nós como um dos fatos que fazem parte do universo?
    Se ele assim o fizesse, todos saberiam de sua existência, e então poderíamos optar por seguir suas orientações ou não.

  21. mateus says:

    Até que a ciência comprove que Deus não existe, eu continuo acreditando N’ele, ou seja sempre.
    porque o que a ciência faz é só contradizer-se cada vez mais.

  22. antonio jaques says:

    RAUL seixas tem uma música que explica a suposta “lei moral” descrita nessa página: na letra de o “carpinteiro do universo”, ele diz ou canta: “o meu egoísmo é tão egoísta que o auge do meu egoísmo é querer ajudar”. E por que um egoísta ia quer ajudar? Porque é bom para mim um mundo onde eu possa sair à rua à noite sem temer por assalto ou perder a vida! Ao querer um mundo melhor para eu viver é que eu saio da minha casa para ajudar os outros a se tornarem aquilo que eu gostaria que se tornassem para realizar meu (pronome possessivo) projeto de mundo e de vida! MAs, não se segue que não possa existir um ser terno que criou o universo, embora eu acredite que Deus e o universo seja a mesma coisa!

  23. Anônimo says:

    RAUL seixas tem uma música que explica a suposta “lei moral” descrita nessa página: na letra de o “carpinteiro do universo”, ele diz ou canta: “o meu egoísmo é tão egoísta que o auge do meu egoísmo é querer ajudar”. E por que um egoísta ia quer ajudar? Porque é bom para mim um mundo onde eu possa sair à rua à noite sem temer por assalto ou perder a vida! Ao querer um mundo melhor para eu viver é que eu saio da minha casa para ajudar os outros a se tornarem aquilo que eu gostaria que se tornassem para realizar meu (pronome possessivo) projeto de mundo e de vida! MAs, não se segue que não possa existir um ser terno que criou o universo, embora eu acredite que Deus e o universo seja a mesma coisa!

  24. Evágrio Pôntico says:

    Para quê racionalizar tanto as coisas que só se apreendem verdadeiramente pelo coração…?
    Nenhum Mestre da Humanidade (Buda, Confúcio, Ghandi…), nem o maior, Jesus, o Filho de Deus, mandou ler obras, nem dissecar tratados. Todos falaram ao coração do homem. Porque só o coração pode atingir a Verdade absoluta e penetrar nos mistérios da Humanidade.

  25. Filó says:

    O blog é muito racional(comparado aos blogs de palhaçada pseudo-moralisa cristã que vemos por aí!),porém é muito cético sobre a crença de um ser humano ser solidário mesmo sem ter religião,ou sem ser preciso acreditar num deus qualquer que seja(eu sou atéia),creio que a minha capacidade de ser contra quaisquer religião não impede a mim de raciocinar e achar preciso fazer algo de bom por outrem,nem de supor a existência de qualquer outra coisa além do deus hilário da gibíblia,como o rapaz acima disse:Buda ou alá também existem para inúmeras pessoas.
    Assim como o deus cristão não existe para os índios,nem por isso eles deixam de acreditar em outra entidade,e merecerem respeito por isso.

  26. Márcio says:

    Um ex-ateu? Isso só me faz ter cada vez mais certeza que não devemos apenas promover o senso crítico, mas a honestindade intelectual. Desde quando podemos “provar” algo pelo simples pensar? O livro de Lewis se comparado com as recentes obras publicadas a respeito da falsa moralidade religioso torna-se supérfluo.
    Leiam “Jesus Cristo nunca existiu” de La Segasse. Vale apenas lembrar que os teólogos acadêmicos, que são, de fato, teólogos, afirmam que a bíblia não tem valor histórico alguém. Ou seja, toda essa falsa e corrupta moralidade como se não bastasse tem origem de lendas e mitos. Fala sério!
    É vergonhoso tanta gente intelectual perdendo tempo discecando um livro de conto de fadas.

  27. Affonso says:

    Opa,
    agredeço pela resposta..
    Eu também não fui muito profundo e claro em meu comentário, peço desculpas por isto.
    Na verdade eu sou ateu, e não costumo comentar em blogs “religiosos” de qualquer maneira. Porém, o seu post me interessou pois você diz que também era ateu (assim como o autor do livro) e que os arugmentos contidos no livro te convenceram da existência de Deus.
    Foi então que eu baixei o livro e o li. Porém os argumentos lá contidos não me convenceram.
    Quanto a ler a doutrina cristã, eu já li muito a respeito sim. Na minha trajetória já fui (nesta ordem) católico, evangélico, espírita, deísta e, finalmente, ateu.
    Espero que eu não tenha te ofendido com alguma parte do meu comentário, esses são apenas questionamentos meus.
    Mesmo assim, parabéns pelo blog, é o mais racional (dos que falam sobre religião) que eu já vi.
    Abraços

  28. sumateologica says:

    Caro Affonso,

    Já li o livro de Lewis, mas faz um bom tempo. Ajudaria se colocasse o local exato das citações que fez.
    Quanto ao último comentário, creio que é possível fazer uma demonstração da existência de Deus independentemente de vinculação a qualquer credo. Também o Deus de Sto Tomás demonstrado nas 5 vias poderia ser Zeus ou Bazok. Porém, isso não nos impede de continuar o raciocínio para finalmente chegar ao Deus da Revelação. De, fato, se Deus é o criador de tudo e fonte de toda e qualquer perfeição, sendo Ele mesmo a suprema perfeição e o bem absoluto, que melhor explicação do que aquela que o identifica com o amor em mais alto grau e que, por isso mesmo, o coloca como aquele que entra na história do homem com um plano de salvação que leva ao sacrifício supremo de si mesmo? Creio que o fundamental com relação ao cristianismo é perceber que trata de fatos históricos, acontecimentos, e não mera teoria, imaginação ou mito. Ademais, a comparação que você fez é meio leviana se não acompanhada da devida profundidade. Eu mesmo já testemunhei muitos “críticos” do cristianismo e da Igreja que no entanto jamais leram uma única página de sua doutrina. Assim fica difícil, não?
    Abraço.
    Obs: estou de férias e sem tempo para internet. Perdoe os erros e a superficialidade da resposta.

  29. Affonso says:

    Cara, acabei de ler esse livro do C.S. Lewis… Ele começa o livro com uma sequência lógica de raciocínios. Mas quando ele chega ao questionamento “Se eu perguntar: ‘Por que devo ser altruísta?’, e você responder: ‘Porque isso é bom para a sociedade’, poderei retrucar: ‘Por que devo me importar com o que é bom para a socie¬dade se isso não me traz vantagens pessoais?’, ao que você terá de responder: ‘Porque você deve ser altruísta'”, com certeza está fugindo do debate!
    Há diversas razões para ser altruísta. Eu não sou especialista no assunto, mas imagino que nós somos altruístas porque vivemos em uma sociedade, e se formos egoístas não seremos aceitos pela mesma (sociedade).
    Mas mesmo que os argumentos deles estivessem totalmente corretos, não sei o porquê de se acreditar que o deus da bíblia seria o verdadeiro… Porque não Buda, Alá, Thor ou Zeus?
    Abraços

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